por Janio de Freitas
O ensaio, na tarde dominical, foi mais autêntico: não tinha povo. Para a posse, o PT providencia a ida de centenas de ônibus, há quem fale em 800 deles, que levem a Brasília forasteiros em milhares suficientes para o que deve ser uma posse presidencial petista. Mas, a poucas horas dessa posse, o PT ainda luta pelo reconhecimento ao seu direito de uma presença menos inadequada ao novo “governo petista”.
O PT se esvazia. Os “governos petistas” esvaziam o PT. Os “governos petistas” servem ao PMDB, proporcionam-lhe a nutrição que trouxe de volta o seu predomínio político, perdido quando o governo do PSDB entregou-se ao PFL, o hoje comatoso DEM.
A militância petista míngua, no corpo e no espírito. Com suas bandeiras relegadas e até contestadas pelos “governos petistas”, nas eleições a militância exibiu a que está reduzida: no seu território, São Paulo, não foi capaz de mobilizar-se, de ser parte efetiva da disputa. Não para enfrentar as dificuldades paulistas dos candidatos do seu partido à Presidência e ao governo estadual, mas para não ser, como foi, com seu alheamento, a causa fundamental dessas dificuldades.
Os chamados movimentos sociais sentiram os efeitos do desalento petista. Com a recusa a ser petistas nos “governos petistas”, mesmo em atitudes tão simples como prestigiar o PT no Congresso, Lula e Dilma fizeram o mesmo por modos e em graus diferentes: Lula conteve os movimentos sociais, Dilma desconheceu-os.
Podem ser 800 ônibus, até mais, é provável que lotados. Mas não será o PT viajando neles. É só aquela lembrança de militância petista, é uma representação da militância que não se moveu nas eleições, porque não foi reconhecida nem reconheceu os “governos petistas”. É uma presença simbólica dos movimentos sociais, imagino que saudosos de si mesmos. São pessoas que esperariam ouvir falar, quando a eleita falou do novo governo, em ainda mais empregos, em distribuição da renda subindo, subindo, subindo muito mais, e o Minha Casa, Minha Vida se completando, e os empresários sendo chamados a gastar menos bilhões em casas no exterior e investir mais no seu país.
Não foi o que o PT ouviu. Por certo, grande parte dos petistas e dos componentes de movimentos sociais nem entendeu o que ouviu, nas escolhas ministeriais auspiciosas para a direita e conservadores em geral. Tudo sugere que a massa dos recém-empregados e dos beneficiados pelo assistencialismo entenderá pelo método prático. É o seu método histórico de aprendizado. Mas são muito diferentes o longo não receber e o perder ganhos. Ainda assim, às vezes dão no mesmo. Às vezes, não.
O que não foi dito quando esperado será dito nos discursos, é o que convém aos discursos dos vitoriosos. E Dilma Rousseff é vitoriosa. À qual acrescenta uma explicação, para os que não entendem como lida com sua vitória: “Saber vencer é não ter medo de mudar a si próprio, mesmo que isso lhe cause algum desconforto”.
Essa, porém, é a sabedoria conveniente a quem perdeu, não a de quem venceu. O perdedor é que não deve temer a lição da derrota, e aprender com a reprovação o que deve mudar para vencer. A sabedoria do vencedor –e, nela, os valores éticos– consiste em ser coerente com o que disse e fez para obter o apoio que lhe deu a vitória.
*Publicado na Folha de S.Paulo