por Augusto Nunes
No dia em que a herdeira dos gigolôs da bola anunciou a consumação do roubo, o confronto entre o exército da selva e a PM piorou o que já era um programa de índio
Até os tufos de grama dos estádios superfaturados sabiam que a Copa do Mundo tem tudo para virar um tremendo programa de índio. Mas nem o mais finório dos cartolas poderia imaginar que, nesta terça-feira, os antigos donos da terra conseguiriam piorar o que já parecia exemplarmente ruim. Como informa o site de VEJA, a proeza foi consumada pelo inverossímil combate travado nas cercanias do Estádio Mané Garrincha por uma tropa de 400 índios e um pelotão formado por 500 integrantes da PM de Brasília.
Segundo os caciques de uma certa Mobilização Nacional Indígena, os combatentes compostos por recrutas originários de 100 tribos distintas pretendiam apenas “entregar uma taça de sangue” a algum figurão do governo federal, num ato de protesto contra mortes de caciques atribuídas a policiais. Os planos mudaram quando os guerreiros que misturavam cocares com tênis ou saiotes típicos com calças jeans toparam com bando de civis que marchavam sobre a arena mais cara fora do mundo árabe para outra manifestação contra a gastança da Copa.
Para impedir que os inimigos se aproximassem do local onde está em exposição a taça que será entregue ao vencedor do certame, soldados a cavalo e índios pintados com as tingas da guerra protagonizaram a versão brasileiríssima de um espetáculo que só pode ser visto em velhos faroestes ou na Disneyworld. A diferença estava no armamento: as bombas de gás lacrimogêneo e as balas de borracha usadas pela PM eram tão reais quanto os arcos e flechas sobraçados pela infantaria da selva. No Twitter, a página do Conselho Indigenista Missionário garantiu que três índios foram feridos. Uma foto exibida pela PM atesta que pelo menos um fardado foi atingido por uma flechada.
As imagens do conflito, transmitido ao vivo por emissoras de TV e já noticiado com destaque pela imprensa internacional, vão exigir acrobacias retóricas especialmente ousadas dos espertalhões que miraram nas urnas e acertaram o próprio pé. Principal responsável pela transformação do Brasil em província provisória da Fifa, Lula logo estará recitando mais uma vigarice panglossiana. Talvez enxergue no episódio uma prova contundente de que, ao contrário do que ocorreu nos Estados Unidos, aqui os índios são uma espécie em expansão. Talvez prefira jurar que tudo não passou de uma inventiva homenagem a Garrincha, o mais famoso descendente de índios da história do futebol.
Se os caçadores de votos são forçados a correr atrás do prejuízo, os mais notórios caçadores de dólares já dormem em paz. “O que tinha que ser gasto, roubado, já foi”, informou há poucas horas Joana Havelange. Eis aí o que se pode qualificar de “fonte bem informada”. Mais que integrante do comitê local da Copa, Joana é filha de Ricardo Teixeira, que hoje gasta em Miami o que embolsou enquanto presidiu a CBF, e neta de João Havelange, o ex-chefão da Fifa que transformou a dona do futebol mundial na Casa da Moeda dos Supercartolas. Esses se afastaram da cena do crime antes da chegada do camburão.
Continuam em ação os que, além de muito dinheiro, querem ganhar a eleição. De olho na divisão do produto do roubo, podem perder a chance de escapar. E nunca estiveram tão perto de cair fora do poder.
*Publicado no site da revista Veja