por Tostão
Ao ver o protesto dos professores, na saída do ônibus da seleção para Teresópolis, lembrei-me de que já estive dentro do ônibus, como atleta, e fora dele, como professor da Faculdade de Ciências Médicas, quando ganhava tão pouco quanto os atuais professores municipais e estaduais.
Entendo os dois lados. Os professores têm razão em protestar. São, assim como a educação, maltratados há décadas.
Os jogadores não têm nada a ver com isso. Eles ganham muito porque são protagonistas de um negócio milionário. Os professores sabem disso. A manifestação não era contra os atletas. Foi uma oportunidade de gritar para serem ouvidos.
O gol de empate do Real contra o Atlético de Madri, nos acréscimos, quando o placar parecia definido e com um resultado justo, já que o Real não criava chances, é mais um exemplo de como um detalhe, um suspiro, muda a história do futebol.
O gol foi a união da técnica com o imponderável. Da técnica, porque Modric, da direita, com a perna direita, como deve ser, cobrou muito bem o escanteio, de curva, forte, com a bola fugindo do goleiro, caindo na marca do pênalti, para Sergio Ramos cabecear. Se a bola se desviasse uns 30 centímetros, ele não faria o gol, todos exaltariam a heroica conquista do Atlético, e o Real seria criticado.
Os pragmáticos vão dizer que “se” não ganha jogo e que a história é contada pelos vencedores. Mas o “se” serve para lembrar que a bola entra também por acaso, que nossa pretensa sabedoria se desmancha em um piscar de olhos e que tudo é muito frágil e incerto.
O comentarista científico, que admiro, pois a ciência é fundamental, explicaria que o gol foi o resultado de fatos anteriores que se comprimiram em um lance final, e que o Atlético recuou demais, o que aumentou as chances de escanteio e de sair o gol. São bons argumentos técnicos. Mas o jogo é muito mais que isso. Para os operatórios, dar importância ao imponderável é trair a ciência e seus conhecimentos.
O imponderável não é destino nem mistério. Faz parte do jogo, da vida. São lances corriqueiros, frequentes, que não sabemos onde e quando ocorrerão. O imponderável não torce para ninguém. Espero que esteja ao lado do Brasil na Copa.
As declarações de Parreira, de que “chegou o campeão” e de que “o Brasil está com uma mão na taça” são a união de uma excessiva confiança, baseada em critérios técnicos, já que a seleção se preparou bem, está pronta, joga em casa, é uma boa equipe (não é ainda um timaço, como disse Parreira), com a tática de empolgar o torcedor, criada por Felipão ou por um marqueteiro profissional.
Tudo isso beira também a onipotência do pensamento, de achar que tudo o que desejo e penso é a única verdade, a única realidade. É preciso valorizar os adversários e respeitar o acaso.
*Publicado na Folha de S.Paulo