17:23LEROS

de Carlos Castelo

§ Um show do Stray Kids, num Morumbis abarrotado, encharcado e alheio à dignidade de um homem maduro. Foi essa minha experiência desse final de semana.

Eu dissera “sim” à filha num momento de amor incondicional e respeito pelos seus gostos. “É só uma banda coreana”, pensei para relativizar. Mal sabia que estava assinando um pacto com o K-pop.

No sábado, chegou o grande dia. O céu, de um cinza tão fechado que parecia saído de um filme soviético dos anos 50, despejava chuva tentando lavar a alma da cidade inteira. E lá estávamos nós: eu com minha capa de chuva, e a filha, eufórica e reluzente feito glitter. O contraste era brutal. Enquanto ela gritava os nomes de Hyunjin e Bang Chan, eu buscava um banquinho seco, uma latinha de cerveja e o WC.

O show começou com uma explosão de decibéis. O estádio virou um frenesi. Os Stray Kids surgiram no palco com uma coreografia precisa. E, além de dançar, cantavam. Ou melhor, emitiam sons incompreensíveis para um piauiense.

A filha, saltava, gritava, filmava  tudo no celular. Molhado e parcialmente manco, eu assistia à cena com a expressão de um ET que caiu no meio do Lollapalooza. As músicas se sucediam, enquanto eu fazia cálculos mentais sobre quantos reais por minuto estava pagando para padecer.

A certa altura, entre duas performances, tentei perguntar à filha se havia algum momento de intervalo. Ela me ignorou com a naturalidade de quem fecha a aba de um anúncio pop-up. Tive que me render. Passei a observar, com um misto de assombro e resignação, o espetáculo da juventude: adolescentes de capas de chuva multicoloridas, luzes piscando nos pulsos, celulares erguidos. Algo bem diferente dos shows do Alice Cooper.

E então veio a última música. A banda acenando, os fãs chorando. Agora reduzido a um ser guiado apenas pelo desejo de encontrar um Uber e um paracetamol, segurei a filha pela mão e a conduzi pelos corredores do estádio.

E assim terminou nossa epopeia: um pai, uma filha, e uma noite de K-pop no Morumbis. Posso ter perdido parte da audição, mas ganhei pontos com minha pré-adolescente.

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