Da revista Veja
Se consolidada, a composição também reuniria força política suficiente para complicar os planos de reeleição de Lula
A exatamente um ano do prazo final de filiação partidária para as eleições de 2026, uma movimentação em curso caminha para criar um gigante na cena política brasileira. Duas importantes legendas, União Brasil e Progressistas (PP) costuram os detalhes finais de um acordo para formar uma federação que reuniria 108 deputados e se tornaria o maior agrupamento da Câmara, superando com folga o PL (92 parlamentares). Além disso, teria a terceira maior bancada do Senado (treze), seis governadores e um quarto dos 5 571 prefeitos do país (veja quadro). Se consolidada, a composição também reuniria força política suficiente para complicar os planos de reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e se transformar em uma peça-chave no xadrez da direita para a disputa do próximo ano.
A aproximação entre as siglas, que vinha ocorrendo nos bastidores há algum tempo, ganhou tração nas últimas semanas. Dirigentes intensificam as conversas para sanar impasses em locais onde lideranças dos dois lados pretendem lançar candidaturas que podem ser conflitantes. Os mais empolgados afirmam que está tudo certo do lado do PP — em 18 de março, a executiva da sigla aprovou a questão — e que o partido aguarda definição do União Brasil, onde há focos de resistência, mas que não devem impedir a consolidação do acordo até o fim deste mês.
Já há, inclusive, um regimento interno elaborado para nortear a relação entre as duas legendas. O comando dos 27 diretórios estaduais ficaria dividido em três terços, com nove estados sob a guarda do PP, nove com o União Brasil e nove liderados pela direção nacional. A presidência ficaria seis meses sob o comando do PP e o mesmo período sob a guarda do União Brasil. A proposta é que o primeiro presidente seja o deputado Arthur Lira (PP-AL), que deixou este ano a chefia da Câmara e que, com isso, voltaria a liderar um contingente expressivo de políticos às vésperas das eleições de 2026.
Os impactos na disputa nacional seriam variados, nem sempre positivos para os políticos desse grupo. O primeiro que pode ser atingido de forma negativa é o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, do União Brasil, que lançou sua pré-candidatura ao Palácio do Planalto no dia 4 deste mês, na Bahia, ao lado de outro cacique da sigla, o ex-prefeito ACM Neto. Na nova configuração, Caiado teria dificuldade para seguir em frente. Se hoje já enfrenta resistências em seu partido, teria, com a federação, de convencer os políticos do PP a endossar sua pretensão. Pela lei, uma federação tem de caminhar unida eleitoralmente por ao menos quatro anos. “Forçar essa federação seria um tiro no pé dos dois partidos”, afirma Caiado. Para ele, o União Brasil e o PP são siglas grandes, consolidadas na maioria dos estados, e a criação de uma agremiação conjunta vai provocar “guerra interna”. Boa parte da rejeição do governador de Goiás à ideia, é claro, tem a ver com seu projeto presidencial. Dirigentes do PP afirmam que a candidatura não está garantida. “Caiado tem toda a legitimidade de se lançar, mas só vamos decidir no ano que vem”, deixa claro o presidente do PP e articulador da federação, senador Ciro Nogueira (PI). O partido tem a senadora Tereza Cristina como alternativa para uma candidatura própria, mas mantém no radar a possibilidade de apoiar um candidato do bolsonarismo, como o governador paulista Tarcísio de Freitas, e emplacar Nogueira a vice.
Caiado não é o único presidenciável afetado pela movimentação. Para Lula, seria um problema a mais na conturbada relação com siglas de centro-direita, tanto no Congresso quanto na definição de alianças para 2026. O petista quer trazer esses partidos para seu projeto eleitoral e aposta na melhoria da aprovação, o que está cada vez mais difícil — pesquisa Quaest mostrou que a rejeição saltou 7 pontos desde janeiro e chegou a 56%, ante 41% que aprovam seu terceiro mandato. “Se o cenário de popularidade em queda se agravar ainda mais, fica bastante complicado para ele negociar”, avalia o cientista político Rodrigo Prando, professor da Universidade Mackenzie. Hoje, o petista conta com o apoio de parte expressiva do União Brasil, que comanda três ministérios na Esplanada, e uma boa relação com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, cacique da sigla. Se o partido se aliar ao PP, a coisa complica porque a legenda tem dado sinais de que quer cada vez mais distância de Lula.
Todo esse estrondo político causado pelo iminente casamento entre PP e União Brasil não ocorre por acaso. Trata-se de um movimento inédito desde o advento das federações. Criadas para salvar os partidos pequenos da cláusula de barreira, agora estão a serviço da união de duas siglas grandes. Apesar dos avanços obtidos, ainda há arestas a serem aparadas até a conclusão do processo. “Até agora não me disseram qual é o objetivo dessa federação”, reclama o deputado Pauderney Avelino (União Brasil-AM). Na Paraíba, União Brasil e PP são rivais. Efraim Filho, líder do União Brasil no Senado, pretende se candidatar ao governo, enquanto o grupo liderado pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP) quer lançar o vice-governador, Lucas Ribeiro (PP). Efraim diz que a chance é zero de qualquer um dos lados perder o controle da legenda. “Sempre há a possibilidade de mudar de partido”, ameaça. No Maranhão, o funil para definição de candidatura ao governo tem dois ministros, André Fufuca (Esporte), do PP, e Juscelino Filho (Comunicações), do União Brasil. Em Pernambuco, os deputados Eduardo da Fonte (PP) e Fernando Coelho Filho (União Brasil) devem apoiar a reeleição da governadora Raquel Lyra (PSD), enquanto o deputado Mendonça Filho (União Brasil) tende a se alinhar a João Campos (PSB).
Essas confusões têm a ver diretamente com o DNA da grande selva partidária brasileira, que não cresceu à toa — são 29 siglas hoje. A proliferação sempre teve relação com a necessidade de atender a interesses do sem-número de caciques. No caso do casamento entre União Brasil e PP, o Republicanos, que participava da discussão, desistiu, para manter o controle de seus políticos sobre o partido. “Os deputados, de maneira quase unânime, entenderam ser melhor o Republicanos seguir independente”, diz o presidente, Marcos Pereira. É essa complexidade para acomodar interesses que está na gênese dos últimos obstáculos a serem removidos por PP e União Brasil. Se isso se resolver, a arena política de 2026 ganhará um jogador importante, que chegará com um trunfo nada desprezível: o de ser o maior agrupamento de centro-direita do país.
Fiquei curioso para saber como seria aqui no PR…