por Elio Gaspari, na FSP
Mesmo argumento atrasou a libertação dos escravos
O governo mandou ao Congresso um projeto pelo qual isenta, a partir do ano que vem, os contribuintes que recebem até R$ 5.000 do pagamento de Imposto de Renda. A medida beneficia 10 milhões de pessoas. Para compensar a perda de arrecadação, quer taxar com um piso de 10% os ganhos de quem recebe mais de R$ 600 mil anuais, o que dá uma renda mensal de R$ 50 mil. A mordida pega 141 mil contribuintes.
O Brasil está entre os campeões mundiais de desigualdade social e a aprovação da isenção é quase certa. Já a taxação do andar de cima abriu um saudável debate. Argumenta-se que Lula deveria pensar primeiro em gastar menos, ou ainda que a taxação inibe investimentos e estimulará a fuga de capitais.
Todos esses argumentos têm seu valor e os debates jogarão luz sobre a questão. O Brasil não se tornou um país desigual anteontem. A ruína vem de longe e vale a pena olhar para trás.
Faz algum tempo, um curioso pediu ajuda ao historiador Manolo Florentino (1958-2021) para achar uma declaração de político ilustre em defesa da escravidão nos anos 70 do século 19 e ele respondeu:
— Você não vai achar. Naqueles anos, ninguém mais defendia a escravidão. Todo mundo era a favor, desde que… Desde isso, desde aquilo, para retardar a libertação dos escravos.
No século 21, todo mundo é a favor da isenção do andar de baixo. A porca torce o rabo quando se discute a taxação do andar de cima. Nada há de novo sob o céu de anil.