por José Maria Correia
Com o passar das muitas décadas meus Natais se tornaram cada vez mais nostálgicos .
Assim acontece com os mais velhos.
Como tudo na vida que passa , boas memórias, recordações e saudades .
E ainda uma compreensão para além dos presentes que fazem a festa das crianças .
O enxergar mais profundo solidário e generoso.
Sobre a verdadeira essência da chegada do Cristo como homem destinado para o martírio.
Dias e noites de reflexões cercam a data, e é quando a sensibilidade se agudiza e mexe com as emoções .
Aquelas que passam o ano contidas ou distraídas pelas agruras do cotidiano e as lutas que nos absorvem e distanciam uns dos outros .
Já vivi muitos Natais .
Mais de 75 .
Lembro que quando criança eu contava os dias de Dezembro e ao chegar do grupo escolar aguardava ansiosamente a mãe .
Ela então abria o cesto de vime onde estavam as delicadas bolas multicoloridas para enfeitar o Pinheirinho .
Minha tarefa era ajudar a montar o presépio com o menino Jesus na manjedoura e os personagens , Maria, José e os três reis magos no estábulo de Belém ou da arrasada Palestina.
Anos depois a mãe e o pai se foram , e fui eu à organizar os natais para as filhas sendo o Papai Noel e o anfitrião.
E já no terceiro ato da vida e no final do outono , também para os netos e netas que já se tornaram jovens adultos.
Talvez os próximos sejam para os sonhados bisnetos , se assim eu seguir abençoado.
Mas meu olhar para o pinheiro, a árvore iluminada já não é mais o dos olhos infantis de ansiedade e brilho, como muito antigamente.
Fui envelhecendo no ciclo do tempo , como um Papai Noel, com a diferença de que não voltarei em tantos Natais .
Em minha nostalgia às vezes melancólica me identifico muito com as obras de Charles Dickens e com destaque para o seu Conto de Natal, o Christmas Carol , o primeiro dos quatro livros que escreveu.
Uma obra atemporal
que contém a crítica social sobre a miséria , a fome das crianças esfarrapadas e o trabalho infantil na velha Londres, como teria sido a própria vida de Dickens em uma engraxataria.
Bem, a obra todos conhecem, ou deveriam conhecer, foi através da literatura e do teatro que Dickens conseguiu estabelecer o contraponto dos que tem o Natal como esperança e generosidade e os que odeiam tudo que não possa acrescentar mais riqueza ou acumulação de bens.
O velhote ricaço Ebenezer Scrooge ( nome que conjuga um referência bíblica com um sinônimo de avareza) do lado da maldade e o seu modesto empregado Tini Tim que luta para juntar uns trocados e proporcionar um festejo de Natal humilde para sua pobre família.
O fato é que o malvado Ebenzer durante a noite solitária é assombrado por três fantasmas.
Aí está a ideia força do conto que se tornou um clássico mundial, com versões para o cinema, desenho animado inspirando o personagem Tio Patinhas e adaptações para o teatro e a televisão.
Os três fantasmas .
Representam o passado , o presente e o futuro do amargo, sovina e solitário Scrooge.
E a mensagem de esperança como boa nova de Natal é a redenção do avarento depois de alertado pelo Fantasma do Futuro que iria morrer pobre e abandonado entre amarguras de uma vida desperdiçada.
Desses três fantasmas convivo com dois há muito tempo em meus sonhos .
O do passado maravilhoso da infância -e também das experiências duras, ao ter vivido duas experiências de quase morte, a primeira enfrentando um gravíssimo acidente automobilístico que me deixou graves sequelas e a segunda, uma doença não menos grave tratada em longo internamento .
Experiências que através da dor e do sofrer me concederam como graça uma visão filosófica mais solidária e holística da vida .
Uma oportunidade rara de renascimento como ser humano na jornada e busca maior da espiritualidade.
Tenho adormecido na companhia em meus sonhos dos anjos desencarnados de nossas vidas, pais, amigos e pessoas que só fizeram o bem.
É um presente dos Natais que tenho recebido .
E o fantasma do presente é um conselheiro que me coloca sob sua luz , me faz cauteloso, corajoso , ousado quando preciso , mas acima de tudo justo, despido de maus sentimentos e de inúteis ambições.
Também enfrento meus pequenos demônios na dualidade que todo ser humano entre os conflitos -de um ético doutor Jekyl e um desconstrutor Mr. Hyde.
O Médico e o Monstro , outro dos meus livros preferidos , surgido de um sonho do autor o escocês Robert Louis Stevenson.
E ainda há o Frankenstein de Mary Shelley.
Aí se pode sintetizar nessas obras todo o conflito no dualismo do bem e do mal que tanto afligiu os filósofos clássicos como Platão.
E infelizmente os que sustentam tantas religiões com falsas crendices , pecados dogmas e terrores que tem na verdadeira fé a antítese.
E tudo somado me faz buscar cada vez mais o significado maior de nossa brevíssima passagem por este generoso planeta de mais de quatro bilhões de anos.
Somos menores que uma gota de água do oceano azul diante do universo infinito.
Mas em nossa vã ilusão nos enxergamos como o centro de todas as pessoas ao nosso redor.
Afinal somos humanos com nossas ilusões.
Bem encerro o tortuoso texto falando sobre o terceiro fantasma , o do futuro e que tanto apavorou o velhote Scrooge mostrando a sua morte no mais sinistro abandono.
Melhor não conhecê-lo e viver como um viajante que prepara sua jornada como um processo de evolução para deixar o microcosmos e nosso casulo para viver nã plenitude do amor.
Que os mistérios permaneçam oculto e se possa trabalhar o ofício de viver como quem constrói estrelas .
E certos que sempre no amanhecer da Noite de Natal haverá esse surgir do encantamento, de uma comunhão de saudades, nostalgias e esperanças em um mundo que anseia por paz, fraternidade , compaixão e redenção.
Como em um sonho de Natal
Vivaaaaaaaaaaaaaa……………..belo texto amigo Xerife ……..joao feio