por Fernanda Richa
Mais burocracia para concessão de benefícios e menos investimento em CRAS e CREAS prejudica as pessoas mais vulneráveis
Más notícias, muitas vezes, vêm embaladas em boas intenções. É o caso das recentes mudanças nos programas de Benefício de Prestação Continuada (BPC) e no Bolsa Família, que, embora busquem combater fraudes e otimizar recursos, podem aumentar barreiras burocráticas e dificultar o acesso dos mais vulneráveis.
As medidas anunciadas pelo Governo Federal para os dois programas reacendem o debate sobre os desafios de garantir a proteção social de maneira efetiva, ao mesmo tempo em que apontam para fragilidades históricas em gestão. É fundamental analisar como essas ações impactam a população mais pobre e expõem limitações estruturais da assistência social no Brasil.
O Colegiado Nacional de Gestores Municipais de Assistência Social (Congemas) definiu as medidas do Governo Federal como “criminalização da população mais pobre e que vive do trabalho, impactando, especialmente nas mulheres, crianças, população negra, pessoas com deficiência e idosas”. Outro ponto de preocupação, afirma o Congemas, é o fato de as mudanças terem o nítido objetivo de limitar o acesso ao benefício e reduzir sua cobertura, representando mais uma barreira para que pessoas idosas e com deficiência acessem um direito
Nos últimos anos, casos de concessão indevida de benefícios a pessoas não elegíveis revelaram falhas nos controles administrativos. A ausência de mecanismos eficazes para cruzamento de dados e fiscalização permitiu o acesso de indivíduos fora dos critérios legais, desviando recursos que deveriam ser destinados a famílias em situação de pobreza extrema. No entanto, corrigir essas distorções não pode significar o aumento indiscriminado de barreiras burocráticas, que acabam punindo aqueles que mais dependem do sistema. Medidas como recadastramentos frequentes e exigências documentais excessivas podem dificultar ainda mais o acesso de quem vive em áreas remotas ou em situação de extrema vulnerabilidade.
Outro fator crítico é o desinvestimento nos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) e Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS), responsáveis por implementar ações de proteção social e acompanhar as famílias beneficiárias. Esses equipamentos enfrentam sobrecarga de trabalho e insuficiência de recursos humanos e materiais, o que compromete sua capacidade de atender às demandas da população e de realizar o acompanhamento sociofamiliar necessário para garantir a efetividade dos programas. Sem o fortalecimento da rede de assistência, as mudanças podem agravar a exclusão social e aumentar a dependência de ações emergenciais.
Além disso, o cenário atual de insegurança alimentar e pobreza extrema reforça a importância de programas como o Bolsa Família e o BPC. Apesar das fragilidades no controle, esses benefícios são instrumentos essenciais para a redução das desigualdades e a promoção da dignidade humana. Qualquer revisão nos critérios de acesso deve ser feita com cautela, para evitar que populações já marginalizadas sejam ainda mais prejudicadas.
Por fim, a solução para os desafios enfrentados pelos programas socioassistenciais passa por uma abordagem equilibrada, que combine maior rigor na fiscalização com o fortalecimento da estrutura de proteção social. Investir nos CRAS e CREAS, modernizar os sistemas de controle e ampliar a capacitação das equipes são passos fundamentais para garantir que os benefícios cheguem a quem realmente precisa, sem comprometer a integridade dos programas.
Proteger os mais vulneráveis não é apenas uma obrigação moral, mas também um pilar para o desenvolvimento sustentável do país. Fortalecer a gestão e a implementação dos benefícios socioassistenciais é investir em justiça social e na construção de um Brasil mais solidário e inclusivo.