6:35Como continuar bolsonarista depois do que foi revelado?

por Joel Pinheiro da Fonseca, na FSP

A trama de golpe não foi para frente porque Bolsonaro se acovardou

Bolsonaro pode alegar que desistiu do golpe na reta final, mas não que não sabia do plano. Não só sabia como o desejava. Temos a esse respeito o depoimento do general Freire Gomes de que se reuniu com Bolsonaro mais de uma vez em dezembro de 2022 e ouviu dele a proposta de ruptura. Na segunda ocasião, o general teve de alertar Bolsonaro de que ele seria preso caso tentasse algo nessa linha.

Sabemos também que Bolsonaro sugeriu mudanças à minuta do decreto de GLO que deveria assinar para dar início ao plano. Quem propõe mudanças num documento deseja usar esse documento. Bolsonaro tirou da minuta a prisão de Rodrigo Pacheco e de Gilmar Mendes, mas manteve a de Alexandre de Moraes. Dado esse fato, será que ele sabia de uma operação dos “kids pretos” para raptar Moraes no dia 15 de dezembro? Isso ainda não está claro.

Está cada vez mais claro que a trama de golpe não foi para frente porque Bolsonaro se acovardou. Novas mensagens recuperadas pela polícia, agora do general Mário Fernandes, expressam a frustração dele com a demora do líder em assinar o decreto. Tudo indica que, com a falta de apoio dos comandantes do Exército e da Aeronáutica e amedrontado com a chance de ser preso caso assinasse a GLO, Bolsonaro deixou seus comparsas ao relento, deixou o poder e foi para os EUA.

E daí chegamos ao 8 de janeiro. Ali, um golpe foi efetivamente tentado mediante violência. O problema é que nenhuma das mensagens e tratativas que vieram a público até agora tinha como projeto um golpe iniciado por populares depois da transição. Em todas elas, o golpe teria que ser dado antes da mudança de governo. Então, temos um quadro inusitado: houve um planejamento de golpe e uma tentativa violenta de golpe. Mas o golpe planejado não era o golpe que foi tentado.

Não que os dois sejam independentes. Um elo claro é a participação dos “kids pretos”. Mas e os demais golpistas? Braga Netto, Mauro Cid? Também participaram da orquestração do 8 de janeiro (escolhendo data, organizando caravanas, encontrando financiadores, etc)? E Bolsonaro, sabia? Isso também não está claro ainda.

Ao que tudo indica, o 8 de janeiro foi a intentona desesperada de milhares de golpistas órfãos de Bolsonaro. Apostaram na ideia de que “o povo” poderia tentar a ruptura. Essa ideia já circulava em fins de 2022. Foi o que disse o coronel Jean Lawand Jr., em conversa com Mauro Cid ainda em 1º de dezembro. Aos apelos de Lawand para que Bolsonaro desse a ordem, Cid responde que o presidente não podia porque não confiava no Alto Comando do Exército. Ao que Lawand retrucou: “Então ferrou. Vai ter que ser pelo povo mesmo”.

Será que a conduta de Bolsonaro se enquadra como tentativa, “mediante violência ou grave ameaça”, de golpe de Estado? Isso a investigação e o provável julgamento dirão. Independente da esfera criminal, no entanto, já sabemos que o ex-presidente tramou um golpe, tentou aliciar generais e que seu círculo mais próximo falava em assassinar o opositor vitorioso, o vice e o presidente do TSE. Assim, pergunto a você, que votou em Bolsonaro no primeiro turno e o apoiou como alternativa política para o país: será que ele é digno desse apoio?

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