por Elio Gaspari, na FSP
Evento realizado em Brasília na última quinta-feira não resolve coisa alguma
Lula organizou na quinta-feira (31) uma reunião com governadores para encaminhar seu projeto de reforma da política nacional de segurança pública. Para seu gosto, foi um êxito, pois adora reuniões, e todos os presidentes que gostam de eventos sonham com pactos. Foi uma solene inutilidade.
A proposta do ministro Lewandowski tem um lado positivo em tese, e outro discutível na prática. Em tese, a unificação dos sistemas de informação é uma boa ideia. Vale lembrar que outra boa ideia, a do cartão nacional de saúde do SUS, com os dados pessoais e médicos das pessoas, veio do século passado e só agora ficou de pé. No caminho, aconteceu de tudo em outros governos, inclusive a compra de equipamentos que não saíram das caixas.
Os sistemas de informação não se comunicam porque os fornecedores querem ter exclusividade e os operadores, por algum motivo, não querem compartilhar informações. Um juiz plantonista que liberta um traficante de drogas quer que sua decisão fique do escurinho do tribunal. Se Deus é brasileiro, o Sistema Único de Segurança funcionará nesta década. Afinal, o Lula 3.0 completará dois anos e o sistema da Polícia Rodoviária não está inteiramente integrado com o da Polícia Federal.
Já a transformação da Polícia Rodoviária numa POF, ou Polícia Ostensiva Federal, tem ingredientes tóxicos. No governo passado, a PRF era conhecida como Polícia Rodoviária do Flávio (Bolsonaro). Nos primeiros dias de governo, havia companheiros querendo recriar uma Guarda Nacional para Brasília.
O pacote da segurança aumentará num tiquinho o campo de atuação do governo federal. Os governadores que reclamam por isso evitam expor seus verdadeiros motivos.
Como a situação chegou a um grau alarmante, Brasília poderá trabalhar à vontade (ou não), valendo-se da Polícia Federal. O caso do assassinato da vereadora Marielle Franco é uma prova disso. O crime havia sido cometido sem um só bandido profissionalmente exclusivo. Na base, estavam dois ex-policiais. Na cúpula, irão a julgamento um deputado, um conselheiro do Tribunal de Contas do Estado e um poderoso delegado. Isso posto, percebe-se porque a investigação patinou no Rio.
A segurança pública desandou porque um conjunto de interesses trava a repressão ao crime. Aí entram interesses políticos, conexões y otras cositas más. Federalizando-se alguns crimes e dando-se poder à Polícia Federal, joga-se contra as organizações criminosas o melhor aparelho de que o Estado dispõe. É o melhor aparelho levando-se em conta seus competidores, mas também não há ali um mar de rosas. Basta dizer que a PF batalha para que seu diretor tenha mandato de dois anos.
Ministério da Justiça contabiliza 88 organizações criminosas no Brasil
Mapeamento da Secretaria Nacional de Políticas Penais mostra retrato assustador
A Secretaria Nacional de Políticas Penais, do Ministério da Justiça, mapeou a extensão do crime organizado no país e sua penetração nas prisões. O retrato assusta.
Existem pelo menos 88 organizações criminosas e elas têm delinquentes detidos em 1.760 pavilhões do sistema prisional. Duas delas, o Comando Vermelho, com predomínio no Rio, e o Primeiro Comando da Capital, predominante em São Paulo, têm alcance nacional. As demais são regionais ou locais. Em três estados, operam 46 organizações: Bahia (20), Minas Gerais (13) e Rio Grande do Sul (13).
Como essas quadrilhas se aliam ou combatem entre si, 7 das 10 cidades mais violentas do país estão na Bahia. Lá existe uma verdadeira guerra de bandidos, na qual vários grupos se enfrentam e combatem a expansão do Comando Vermelho e dos aliados do PCC.
Em Minas Gerais, pela sua posição geográfica, o PCC e o Comando disputam áreas.
O trabalho da Senapen mostra que as rivalidades entre essas quadrilhas é um fator relevante na produção de altas taxas de criminalidade em algumas regiões do país.
Até a reunião sobre segurança foi melada pelo PCC.