de Carlos Castelo
§ Eu estava terminando a faculdade de jornalismo quando a colega Titina Egreja fez o convite: “Você mexe com música, aposto que vai adorar conhecer o Arthur Moreira Lima.” Nunca imaginei que ela fosse tão próxima ao Pelé do Piano. E, é claro, disse sim. Na noite seguinte, fomos recebidos por ele e sua esposa, Dominique, em um espaçoso apartamento na avenida São Luiz.
Servidos os whiskies, Arthur falou longamente sobre sua temporada na União Soviética como aluno do Conservatório de Moscou. Fez uma comparação que nunca mais esqueci: afirmou que a URSS era como o Brasil, um lugar mais “bruto”, enquanto a Polônia, sua vizinha, era menor e mais refinada, como a Argentina. Fazia, e ainda faz, todo o sentido.
Enquanto ele conversava animadamente, eu não conseguia tirar os olhos do enorme piano de cauda no meio da sala, ansioso para ouvi-lo tocar. No entanto, Arthur parecia mais interessado em outros temas. Foi até o aparelho de som e colocou gravações do programa humorístico carioca dos anos 1940, PRK-30. Riu como uma criança de um quadro em que Lauro Borges e Castro Barbosa narravam, de forma sarcástica, um páreo no jóquei. Bem mais tarde, sem que ninguém pedisse, ele se sentou ao piano e tocou uns 20 minutos de choros de Ernesto Nazareth. Chorei. Assim como quando soube que ele nos deixou.