ATRÁS DO BALCÃO
Só aprendemos a viver vivendo. O punhado de alho posto no prato da balança Filizola do armazém do meu pai.
O prato desceu um pouco, acusando excesso de grãos. Para mim seria indiferente se o freguês tivesse o benefício, levando para casa o brinde de um dente de alho. Percebi que ele olhava feliz para o fiel da balança. E vi a nuvem escura que desceu em seu olhar quando retirei um pequeno dente, fazendo com que as coisas fossem como deveriam ser.
Talvez aquele freguês tivesse me odiado por não ter sido contemplado. Não sei. Nunca saberei. O que sei é que aquele meu ato de desbondade – que é diferente de um ato de maldade – ficou puxando minha orelha, e até hoje, se vou dar uma gorjeta a algum serviçal, aquele olhar a principio esperançoso diante da balança do armazém do meu pai, e em seguida derrotado, ainda sorri para mim, cheio de esperança.