por José Maria Correia
Lutar nas entranhas do monstro é enfrentar de dentro a discriminação institucional.
Uma corporação antiga, como as outras, onde para os negros só havia espaço entre os subalternos.
E também não havia na, década de 70 , uma única delegada ou mulher ocupando chefias,
Essa foi a instituição em que ingressei por concurso em 1972.
E neste mais de meio século vi transformar e evoluir no quebrar de paradigmas.
As correntes de aprisionamentos eram culturais, mas muito sólidas.
E as convenções as mais retrogradas.
Mas foram os movimentos trazidos pelo sangue novo que produziram essas transformações.
Aqui repercutiram os protestos dos irmãos negros que ressoavam em todo o mundo, como o do ídolo do esporte e campeão mundial de boxe Cassius Clay , o Muhammad Ali.
E os assassinatos do reverendo Martin Luther King e de Malcom X.
Os protestos da geração de 68 e as barricadas em Paris que abalaram os pilares desses anacronismos.
E também a lenta agonia do regime militar que sufocava a liberdade de expressão, proibia sindicatos e exercia a censura nos cinemas, na literatura, no teatro e na imprensa.
De minha muita humilde parte tive meus exemplos e referências.
Aqui em casa , a mãe mesmo.
Professora do estado lutando pela vida, desde adolescente na remota Quatiguá.
O avô indigenista e antropólogo na proteção dos indígenas e contraindo todas as doenças tropicais nas matas e nas florestas.
E a esposa e companheira de uma vida , também professora e lutando com as dificuldades dos salários baixos e das escolas de periferia sem estrutura.
Intelectualmente foi a Biblioteca Pública que me apresentou a filósofa Simone de Beauvoir, onde aprendi sobre a igualdade de gênero em “ O Segundo Sexo “, a mais atemporal das obras sobre a condição feminina em um mundo construído para homens e pelos homens.
Não só ela , mas também Clara Campoamor, Frida Kahlo, Anita Garibaldi, Pagu, Angela Davis . Françoise Sagan, Dolores Ibarruri , Rosa de Luxemburgo e Olga Benário.
Mulheres que desde Chiquinha Gonzaga e antes dela lutaram pelo sufrágio universal , pelo fim do fascismo e por uma visão holística da sociedade e do universo feminino com igualdade.
E ainda na geração de 68 , a mais contestadora do estabilishment conservador e reacionário, os palcos de Bibi Ferreira , Leila Diniz, Domingos de Oliveira, Dina Sfat, Beth Mendes, Ítala Nandi, Clarice Lispector, Gal Costa, Maria Bethânia , Rita Lee e toda uma legião de artistas , escritoras , compositoras e intérpretes que fizeram soar as trombetas de Jericó nas derrubadas das muralhas.
E neste Dia Internacional das Mulheres é que vejo o quanto já avançamos em termos de participação institucional e quanto ainda teremos que avançar até que tenhamos mulheres nas chefias das instituições e das representações classistas.
Quando apresentamos a extraordinário colega Maritza como candidata para vice-presidente da nossa Adepol na última eleição, demos um passo a mais.
E sabemos o resultado real das urnas como reconhecimento.
Mas ainda é preciso avançarmos numericamente nas representações em Conselhos Superiores e no próprio comando da instituição, DG e DGA .
Estabelecendo cotas se for preciso , até que as chefias se tornem proporcionais entre gêneros como imperativo.
E como não lembrar desse tesouro que temos entre nós , a veterana colega Tereza Cabistani, mulher que enfrentou toda a carga da violência da discriminação e do preconceito.
E lutou com a galhardia e o amor próprio dos irmãos e irmãs afrodescendentes , combatendo sempre o bom combater e guardando sua fé.
Sem nunca , em hipótese alguma, ter chamado para sí todas as homenagens de que é merecedora e credora de seus colegas.
Neste nosso imenso país , um verdadeiro continente de desigualdades e preconceitos a luta se inicia quando o dia ainda é noite e as mães despertam de um sono indormido para achar um lugar no mundo para os filhos da pobreza , da desigualdade e da injustiça.
E a sociedade dorme distraída em seu sono conciliador das desigualdades
Para as mulheres, deixo neste e em todos os dias minha curva solene de reverência e absoluto respeito , admiração e amor fraternal.
Permita-me acompanhá-lo nesta reverência, prezado Zé Maria.
Sensacional Xerife ……….joao feio