18:12O meu time 

por Mário Montanha Teixeira Filho

O Clube Atlético Paranaense (CAP) completará cem anos no dia 26 de março. Acompanho-o desde menino, e sobrevive em mim o nome simples da paixão, sem o entusiasmo afetado dos que ressuscitaram o Club Athetico da origem – prefiro desse jeito, reduzido de estrangeirismos. Para registro pessoal da data, escalo o time da minha vida, com titulares, reservas e algumas referências breves.    

  1. O rigor histórico diria que Caju, a Majestade do Arco, é nome incontestável. Sei disso e respeito a lenda. Caju se fez o goleiro eterno, embora eu nunca o tenha visto jogar. Nem precisaria. Foi o melhor, e deve ser mantido no panteão dos heróis, intocável, deus rubro-negro a guiar nossos passos. Para o meu modesto time, coloco Altevir, camisa 1, sob as traves. O Altevir que eu vi, enlameado, encharcado, a contemplar a imensidão do campo debaixo das traves do seu cotidiano, um homem bom a defender as nossas cores. Pertence-lhe o recorde de partidas sem levar gols. Foram impressionantes 1066 minutos – ou doze jogos – em que a bola não conseguiu ultrapassar a linha guardada por ele. Altevir é símbolo de um tempo difícil – os pesados, tenebrosos e frios anos 1970 –, de alegrias efêmeras e sonhos que pareciam distantes. Altevir sou eu, menino a lutar contra forças ocultas e poderosas, a enxergar raios de sol num horizonte inalcançável. Eu e a minha utopia. 

Para a reserva do ídolo, nomeio Roberto Costa, cujas defesas impossíveis acompanhei já na fase adulta, no começo dos anos 1980. Roberto foi a segurança de um time que atacava muito. Um time campeão depois de longo tempo de espera e fracassos. Dou-lhe a camisa 12.  

  1. Djalma Santos, o meu camisa 2, foi o maior de todos. Por obra e graça de Jofre Cabral e Silva, um dos nossos primeiros campeões do mundo vestiu o fardamento vermelho e preto que povoou meus sonhos de criança, e que lhe caiu tão bem. Um fardamento que não existe mais, como não existe a simplicidade que se espalhava pelos gramados. Eu vi o melhor lateral direita do mundo vestir a camisa do meu time, dedicar-se a ele, amá-lo com sinceridade e decretar a sua aposentadoria aos 41 anos de idade. Eu e os meus olhos cheios de encanto. Eu também vi, com orgulho enorme, o capitão que pela primeira vez levantou a taça Jules Rimet, o gigante Hideraldo Luis Bellini, exibir a sua enorme categoria em jogos disputados na velha Baixada. Bellini, como não poderia deixar de ser, é o meu camisa 3.

A dupla campeã do mundo faz parte das minhas recordações de 1968, dos meus primeiros nove anos de vida. “Para mim, Djalma Santos e Bellini eram jogadores nascidos e criados na Baixada – até então, nada mais do que um muro vermelho e preto que eu via todos os dias no caminho da antiga escola. Algum tempo depois, eu descobri que a Copa do Mundo não era a extensão do lugar onde fazíamos as refeições. E que a dupla que eu tanto amava tinha vestido a camisa da seleção em 1958 e 1962. Os meus ídolos conquistaram o bicampeonato mundial. Mas isso não importava. Acima de tudo, eram dois atleticanos”.   

 

  1. Filho de Caju, Alfredo Gotardi dominou a quarta zaga durante muitos anos da década de 1970, posto que ocupava como se estivesse a conduzir o meio de campo, com classe e visão de jogo. Alfredo é o meu camisa 4.

 

  1. O meu camisa 6, Júlio José Pepicelli, fez da lateral esquerda a sua casa, tomou conta dela e distribuiu sangue e raça pelos campos por onde passou.

 

  1. Para vestir a camisa 5 do meu time, indico Fernandinho, rubro-negro de corpo e alma, por tudo o que fez e o que faz pelo clube.

 

  1. Poderia escolher Gildo, das lembranças de 1968, mas fico com Buião na ponta direita. O meu camisa 7, que já havia passado por grandes clubes brasileiros, correu muito em defesa das nossas cores. É o meu escolhido.

 

  1. Não há como pensar no CAP sem dizer de Barcímio Sicupira, o artilheiro maior, personalidade que virou estátua, símbolo do clube. Ave, Sicupira, o camisa 8.

 

  1. Zé Roberto foi o melhor jogador do meu tempo, o mais habilidoso, o mais espetacular, o mais polêmico. Para nosso desgosto, o adversário levou-o quando ensaiávamos uma história de amor que poderia ter durado para sempre. Deixo-o, portanto, para os que vestem as outras cores, porque me parece mais justo. E fico com Assis, o camisa 10, parceiro de Washington, do Casal 20, e portador de talentos parecidos, que resultaram em gols fantásticos e exibições reiteradas da arte de fazer o simples.

 

  1. Darei a Alex Mineiro a camisa 9 do meu time. Não poderia ser diferente. Ninguém fez o que ele fez. Ganhamos o Brasileirão de 2001 pelos pés de Alex Mineiro. Das recordações daqueles dias, fico com a síntese do último dos oito gols que ele marcou em quatro jogos decisivos: “Onde eu estava no dia 23 de dezembro de 2001? Eu estava em todos os lugares e em nenhum lugar, porque tudo era fantasia e tudo era real. Eu estava na Curitiba das ruas sem asfalto, primeiro, e da modernidade afetada, depois, eu estava em São Caetano, em Santo Antônio de Lisboa, em São Francisco, em Madri, em Havana, em Porto Príncipe, em Santiago, em Cachoeiras de Macacu. Eu estava no mundo, flutuando como espírito, porque nada era matéria, nada era concreto. E foi assim até que os pés abençoados de Alex, o Grande, o Mineiro, o Eterno, encontraram a bola que lhes foi servida pelo tiro de Fabiano, espalmado por Sílvio, e a fizeram descansar solenemente no lugar que lhe havia sido reservado pelo destino. Gol, delírio, certeza. Éramos campeões!”.  

Façanha parecida só mesmo a de Ziquita, a quem entrego a camisa 15. O Ziquita dos quatro gols feitos nos quinze minutos finais de um jogo em que éramos goleados pelo antigo Colorado. Façanha que presenciei dos degraus de tijolos da Baixada de então, aflito à espera do resultado que os astros anunciavam: 4×4. Nelson Rodrigues, impressionado com aquilo, falou de Ziquita: “Ele estava num jogo definido. Além de estar definido, ainda estava o time com dez homens. Foi aí, vejam vocês, que o técnico do Atlético disse a um repórter que via o jogo a seu lado: ‘Vamos empatar essa partida’. O outro achou das duas uma: ou o homem estava louco ou fazendo piada. Nem uma coisa nem outra. Simplesmente, estava anunciando o que lhe parecia a imaculada verdade. Foi aí que o atacante Ziquita fez o primeiro gol. Mas um gol, apenas um gol, nada tem a ver com o Sobrenatural de Almeida. O Colorado ganharia de 4×1 e o Atlético continuaria goleado da mesma maneira. Em seguida, porém, o atacante fez o segundo gol. E, então, começou a loucura. Saiu o terceiro gol, e feito pelo mesmíssimo Ziquita. Vocês perceberam? O Ziquita, nessa altura dos acontecimentos, ventava fogo por todas as narinas. O 4×3 já era alguma coisa de colossal. Mas o incrível foi o Ziquita fazer os quatro gols em 15 minutos. Os idiotas da objetividade vão querer banalizar o prodígio. Mas o fato é o seguinte – não há explicação possível fora o Sobrenatural de Almeida”.  Eu, portanto, e o Sobrenatural de Almeida.

Feitas as considerações iniciais sobre nossos centroavantes, deixo a camisa 18 com Washington, parceiro de Assis.

 

  1. O melhor ponta esquerda que meus olhos testemunharam, Nilson Borges carrega para sempre a camisa 11 do Furacão.

 

  1. Eis o técnico do meu time, o timoneiro de um esquadrão de sonho, de quem eu tanto discordei nos meus tempos de corneteiro, com o respeito a reverência que ele sempre mereceu: Waldemar Carabina

 

  1. E o cartola fundamental, o presidente que simboliza a história completa do clube? O cartola fundamental deu a vida pela sua paixão, num jogo dramático em Londrina, no ano que não terminou: Jofre Cabral e Silva.

 

  1. Alguns nomes que não dá para esquecer (os números das camisas são chutados, sem rigor técnico ou científico): camisa 1 – Vanderlei, Picasso, Gainete, Ricardo Pinto, Flávio e Santos; camisa 2 – Cláudio Deodato, Ariovaldo, Luisinho Neto, Alberto e Alessandro; camisa 3 – Charrão, Nair, Di, Jair Gonçalves e Gustavo; camisa 4 – Rogério Corrêa e Thiago Heleno; camisa 5 – Sérgio Lopes, Didi Duarte, Lino, Ivair, Nem e Alan Bahia; camisa 6 – Ladinho, Sérgio Moura e Fabiano; camisa 7 – Gildo, Capitão e Marcelo Cirino; camisa 8 – Adriano, Kleberson, Jadson e Bruno Guimarães; camisa 9 – Madureira, Oséas, Washington (Coração Valente), Marco Ruben e Pablo; camisa 10 – Nivaldo e Cristóvão; e camisa 11 – Paulo Rink, Denis Marques e Nikão. Técnico: Geninho. Estádio: Joaquim Américo Guimarães, a Baixada.

2 ideias sobre “O meu time 

  1. joao feio

    Parabéns ………li com gosto e viajei no tempo….bons tempos ………..de todos que vi jogar pois vou fazer 70 anos SICUPIRA foi o bam bam rsrsrsrsrs Vivaaaaaaaaaaaa……………………..Presidente o Petralia………joao feio

  2. mario

    Cara…eu sou atleticano….Vindo do Norte do Paraná, de Jandaia do sul…do tempo do Kosilek…Era um bom atacante do Cruzerinho…o nosso time e a nossa republica para fazer a Universidade e desfilar o meu futebol nos campos da Agronomia….. fui residir perto da Baixada,,,e me apaixonei…… O texto é belo e contempla as paixões atleticanas…. Parabens e com certeza muito pouco reparo ao conteúdo…..mas a construção gramatical é bela…

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