10:38Os olhos

por Sergio Brandão

A moça segura no braço do rapaz que vai à frente. São os próximos na fila do pão no mercado. Ele pede três pães. Ela brinca perguntando se hoje ele a deixaria sem comida. O cara sorri e já respondendo que quatro pães é muito para os dois.
Sempre sobra um, diz ele.

É sábado finzinho da tarde. Peço meus pães, também três que até amanhã cedo não sobra nenhum. Reencontro a dupla mais adiante, agora entre as gôndolas de produtos de limpeza. Ela segurando no braço dele.

-Amor, me tira daqui, vamos pelos fundos, beirando a bancada das frutas. Gosto do perfume delas. Não gosto destas gôndolas e desta multidão que vamos encontrar no final do corredor, próximo aos caixas.

Ele dá uma gargalhada e com a voz bem serena, diz que o mercado nem está tão cheio assim. Ela para, ele obedece o comando da mão da moça que aperta o braço dele. Com os olhos girando, girando, girando, ela abre um meio sorriso e agradece.

-Mas como assim se ouço tantas vozes… tenho a impressão que isso aqui está lotado de gente?
-Não amor, tá bem tranquilo, o rapaz diz isso com voz quase melosa. Ela agradece pelos seus olhos que enxergam por ela e se dirigem até a bancada das frutas.

No caminho ela diz que se sente aliviada. “Meus olhos estão na barriga, como sempre, toda a sua descrição do ambiente, me causa sensações que se manifestam na barriga. Vai do alívio de saber que o mercado não está cheio e de ter você como guia, diz ela também bem carinhosa.

Sigo a dupla até que chegamos aos caixas que estão cheios, as filas são grandes. O rapaz escolhe uma. Ela percebe o ambiente e com expressão de pavor, pergunta:

-A fila tá grande, né amor?
Com a mesma voz de antes, o rapaz responde seguro: “Não, amor, logo saímos daqui”. Fala isso abraçando, apertando ela sobre ele. Ela deita a cabeça no ombro dele. Fazem silêncio até serem atendidos.

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