por Voltaire de Souza
Na procura por cargos no Exterior, policiais bolsonaristas podem ter surpresas
Portugal. Itália. Estados Unidos.
Nesses países, cresce a presença brasileira.
Carlos Gastão era delegado da Polícia Federal.
—Bolsonaro na cabeça.
O corre-corre é grande na instituição.
Com a derrota do mito, o momento é de procurar cargos no Exterior.
Carlos Gastão analisava planilhas e organogramas.
—Portugal é uma boa… tem praia.
O policial se dedicava ao surfe nas horas vagas.
—Mas será que eu vou ter de aprender portunhol?
Ele ficava na dúvida.
—Qual o cargo que podem me indicar por lá?
A secretária administrativa Kirlene dava ajuda pelo celular.
—Chefia do Programa Organizado de Repressão aos Refugiados Africanos.
—Pô… mas será que precisa entender do assunto?
—Mas você entende, Carlos Gastão… você é uma espécie de refugiado também.
—Só que eu não sou africano, pô. Tudo bem que sou um pouco moreno…
—Ih… espera um momentinho. O cargo já foi ocupado.
—Itália, quem sabe?
—Centro de Apoio ao Travesti Submetido a Ofensas.
—Eu, hein? Lá sou de me meter nisso.
—Mas depois você pode arranjar passaporte italiano.
—Nos Estados Unidos não tem nada não?
Kirlene deu um suspiro.
—O pessoal da Polícia Rodoviária tem prioridade.
—Pô, Kirlene. Dá um jeito aí… eu nunca pedi nada pra você.
A prestativa jovem teve uma ideia.
—E o Qatar? Se a gente correr…
O coração patriótico de Carlos Gastão bateu mais forte.
—Será que eu pego o final da Copa?
Os dedos de Kirlene corriam pelo teclado.
—Aqui… com formulário e tudo.
—Faz isso rapidinho, chuchu.
—Você recebe a confirmação ainda hoje.
Carlos Gastão respirou aliviado
—Um uisquinho para comemorar.
O email chegou em poucas horas.
—Cargo aprovado.
O rapaz foi checar.
—Qatar… é isso mesmo?Não era o próspero país muçulmano.
Era a Quarta Aerodivisão de Tráfico de Armamentos.
Situada em plena floresta amazônica.
Pertinho da fronteira com o Peru.
Carlos Gastão tenta se conformar aos poucos.
—Quando o inimigo é forte demais, o melhor é aderir a ele.
Os bons investigadores sabem.
Antes de tomar decisões precipitadas, é preciso conhecer os detalhes completos do caso.
*Publicado na Folha de S.Paulo