Aos 15 anos pude comprar meu primeiro sapato. Morava no mato, mas perto de uma cidadezinha do interior do fim do mundo. Ganhei meus trocados porque fugi do cabo da enxada. Minhas mãos de dedos longos não eram feitas pra isso. Pele lisinha. Preferi passar alguns anos viajando no lombo de uma mula. Ia atrás de coco, leitãozinho, tudo que achava que poderia render algum em feiras de outras cidades. Antes dos 20 embarquei para a grande aventura. Foi mesmo.! Capital Federal, depois a grande metrópole industrializada. Tempos e tempos de marmita até cair do céu a chance de ser um pequeno comerciante. Filhos criados, voltei pra terrinha. Cansado de guerra. Tinha uma casinha e o sítio herdado. Foi bom até a doença aparecer e me deixar preso numa cama. Então eu penso em tudo que vi – e ouvi e vejo agora na tv. Aí me vem a mesma certeza daquele tempo em que enfiei o pé no bico fino: essa merda não tem jeito.