Tinha uma mesinha e um rádio pequeno. Sempre eram sagradas as tardes de domingo. Na volta da matinê no cinema do bairro, encontrava-o sentado de lado, cotovelo direito na madeira, mão espalmada entre a testa e o começo da calvície, e dois dedos da outra mão enrolando, nervoso, a ponta do bigode tradicional. O seu Santos, de Pelé, estava em campo, qualquer campo, e parecia que enfrentava algum monstro feroz. Nunca foi ao estádio. Nunca viu o Rei, mas anos depois ganhou um autógrafo do próprio antes de partir para o desconhecido. Um dia o filho perguntou como é que ficava nervoso com aquele time que é o maior e melhor da história do futebol. Nem respondeu. Nem precisava. Só olhou, como sempre fazia – e como se perguntasse: você não sabe o que é futebol? Ali, ao ver o jogo, ouvindo as narrações, aquele ser fechado se mostrava por inteiro numa paixão que não tinha como esconder.