por Alvaro Costa e Silva
Guru da contracultura, não buscava o lacre nem a falsa polêmica
Luiz Carlos Maciel escreveu sobre beats, hipsters, hippies. E sobre o Caetano, o Zé Celso e o Glauber. Não só leu em primeira mão como apresentou ao Brasil pensadores como Wilhelm Reich, Carlos Castañeda, Allan Watts, Norman O. Brow, Timothy Leary. Fez um glossário explicando aos pais de seus leitores o que queria dizer desbunde, careta, barato, grilo.
Não sei se escreveu sobre nerds. Maciel era um deles, de alguma maneira. Não no sentido de um homem pouco atraente e inábil nas relações pessoais —ao contrário, ele era bonito e bom de papo—, e sim quando o uso da palavra define uma pessoa com inteligência avançada e obsessão por determinados assuntos. No caso, a contracultura e as mudanças comportamentais dos anos 60 e 70, temas que abordou na coluna “Underground”, em parte responsável pelo sucesso do Pasquim no auge da ditadura militar.
Na época em que o escritor e jornalista gaúcho, mas com alma baiana e vivência carioca, se tornou leitura obrigatória entre os jovens mais antenados do país, não havia CD, DVD, televisão a cabo. Muito menos internet, celular, redes sociais. Morto em 2017, ele considerava a tecnologia um avanço da humanidade, claro, mas lamentava que o mesmo não pudesse ser dito em relação à política, saúde psicológica, crescimento espiritual e o que chamava de “liberdade interna e externa”.
O Maciel guru —rótulo do qual fugiu, sem conseguir— reaparece na coletânea “Underground” (Sesc), organizada com olho clínico por Claudio Leal. São 70 textos publicados entre 1958 e 2018, alguns com sabor de inéditos, pois esquecidos em empoeiradas coleções dos jornais Correio da Manhã, Última Hora, Flor do Mal.
Neles, o contraste com o tratamento que se dá à cultura hoje é brutal. Maciel não era um influencer, embora tenha feito a cabeça de tanta gente. Sabia o que dizer e o dizia sem afetação ou vaidade. Não buscava cliques, lacres, polemismo, cancelamentos.
*Publicado na Folha de S.Paulo