6:58Pedras

de Thea Tavares

As pedras extraídas das minhas dores foram enterradas no quintal, como cultivo de uma vida de experiências que edificaram, mas que nunca me pertenceu, nem sequer rotulou.

Somente deixei tatuar feridas necessárias de serem percebidas num discreto e efêmero relevo riscado na pele.

Mero aprendizado.

Projetei um jardim. Enterrei-as com sementes de girassóis, em manifesto de promessa, a ser fielmente cumprida, sobre um promissor recomeço, como são carregados de mudanças, releituras, desejos e de esperanças todos os momentos que portam essa marca.

Entre canteiros de flores coloridas, que se abrem num sorriso da natureza, pomares frondosos e hortaliças.

Plantei uma parte da história, que, sendo história, também narra e compõe, podendo semear e alçar vôos aleatórios ao vento.

Mas que, sozinha, tão pouco me define ou orna.

Vai brotar desse cultivo uma nova realidade, por meio da qual a vida escancara todas as lições e sentidos, inacessíveis sem as falhas, as perdas e os danos dessa humanidade. Para desassombrar o passado.

Acordar não é mais tão penoso!

A saudade mora nos esconderijos da noite e nos silêncios dos quereres. No marcapasso do relógio, reside a métrica das ilusões e sensações. Forjadas sob o peso de esperas e anseios… Medos, inseguranças e desconhecimentos.

A saudade martela e martela mais, mesmo intuindo que a vida trata de ressignificar e de direcionar tudo a seu tempo, no acerto das contas e na medida dos merecimentos.

Essa força é ponto fraco e simultaneamente mágico: a centelha divina, só percebida no espelho de cada alma.

Por isso, decidi enterrar as pedras e demarcar seu novo espaço no canto restrito das memórias que não doem mais e nem estimulam reações. Diluídas e integradas ao processo.

Para germinar em direção à claridade e expandir suas cores e brilho a todos os olhos que puderem perceber e se encantar distraidamente nas emanações desse movimento, até encarar a fonte das próprias animações, suas pedras,  sementes e canteiros.

Numa compreensão profunda e maravilhadamente sentida do que nos faz únicos e verdadeiros.

Íntegros e perfeitos naquele preciso instante e em devido estado de consciência.

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