Uma breve história
Toda vez que escuto qualquer motor de carro ligando e estou em meu apartamento captando todas essas informações que vêm de tudo, eu penso que é meu pai que veio me buscar. E, nisso, logo me vem o inextricável questionamento existencial: a morte e a perda de quem amamos. Qual será a minha reação a este momento? O que me fará permanecer sem meu pai? Por que existe a morte? Que processo é esse de separação que não podemos esquecer? E a dúvida sobre o reencontro? Escrevendo agora, lembrei-me do filme Contato, um dos que guardo em minha lista dos que marcaram a vida. Ela reencontra o pai depois de sondar o Universo em busca de sinais, criando o que a levaria a ele. Meu pai me ensinou a seguir – mesmo que eu fique presa por correntes invisíveis, título de uma de minhas poesias. Porque costumo olhar para as ruínas de minhas ilusões e jamais me olhar como quem sabe que viver é apenas uma explicação muito mal dada a todos que estavam apenas vivendo e esquecendo o passado. Eu, no entanto, olho o passado como a construção de uma paisagem em que todos os personagens estão se cumprimentando como bons amigos e que não esperam nada uns dos outros. Talvez se tivesse sido tal qual como digo, muita amargura seria evitada. E todos os dias eu acordo com uma dor permanente de uma doença fictícia criada para justificar qualquer ponto final de histórias. Como eu devo estar angustiada com tantas mentiras e tantas reminiscências que ficam ressoando em um eco profundo de um espelho em que não mais se admira a estatura de um homem pelas cordas que o prendem à sua própria imagem, mas, sim, o que se tem conseguido expor com um tanto de veemência sem que se pareça com uma ameaça aos que não sabem imprimir seus passos em uma bolha de sabão. As bolhas são tão elásticas quanto a capacidade de se distanciar do calor humano e da vida que não se pode ser sentida, apenas erguida a um patamar onde muitos se devoram e se olham como vilões e mocinhas. A minha última tentativa de escapar dos olhos cegos é me esconder na própria criação de fantasias e desejos que, como vermes, entram em meus poros em uma dinâmica em que absorvo mais do que posso e não sei mais penetrar a própria pele. Por trás de minha retina brilham as constelações que em suas mudanças fazem com que toda matéria seja retida em apenas um olhar. Olho ao meu redor e vejo caírem poeiras aleatórias como em um deserto de areia que foi o que meu primeiro e único amor me deu de presente junto a uma rosa. Lá no alto estávamos. Permanecíamos juntos em nossas próprias solidões. Nos condenamos a viver sempre em segredo para que não admirassem os sonhos de duas almas tão puras e verdadeiras em suas convicções. Porém, quando fomos chamados pelas inglórias batalhas entre o bem e o mal, nos afastamos para permanecermos inteiros. Escrevo uma página apenas para que pelos correios possa ir algo singelo e sincero e que possa ser colocado ao lado de um porta-retratos como memória de uma vida que se repartiu e se jogou ao chão para não morrer antes. E que se resgatou pela ausência de memórias que pudessem aumentar os espaços de suas próprias mãos ao tocar a terra.