6:32LEROS

de Carlos Castelo

§ Já tive vergonha de ser publicitário. Foi no tempo em que não ser engajado politicamente era vergonhoso. E os publicitários – com aquela coisa de serem os caras que dominavam a arte de separar as pessoas de suas carteiras – eram mal-vistos. Dizia que era comunicador. As pessoas confundiam, achavam que eu trabalhava em programa de auditório, mas era melhor que ser visto como um abutre. Com o tempo (e o neoliberalismo) ficou mais aceitável trabalhar na área. Falava-se que a atividade tinha um valor intrínseco por informar ao consumidor sobre as diferentes possibilidades de compra. E que, sem ela, a mídia impressa e eletrônica perderia a independência para fiscalizar o poder. Comecei a admitir em público que era criativo. As pessoas achavam “cool”. E me chamavam para dar palestras, chefiar redes de agências transnacionais, ser entrevistado em talk-shows. Foi um momento febril, fervilhante. Aí veio o Marcos Valério. Corta para pack-shot.

§ – …sou antifascista.
– Mas de que tipo?
– E tem tipo?
– Você é um antifascista que assina manifesto, por exemplo?
– Manifesto?
– Têm uns aí nas redes sociais. Dizem que rola mais fascistas do que antifascistas neles.
– Não, não sou do tipo que assina esses manifestos.
– Ah, já sei, você é um antifascista passivo.
– Nada disso, sou muito ativo. Mas me fala uma coisa, e você, é o quê?
– Tava só querendo trocar uma ideia aqui no messenger. Sou robô de fake news.

§ É sempre bom voltar a Voltaire. No verbete Virtude, de seu Dicionário Filosófico, o satirista escreve sobre o imperador Antonino: “fazia reverterem a si próprio os benefícios que fazia ao gênero humano; que foi toda a sua vida justo, trabalhador, benfeitor por simples vaidade, e que apenas enganou os homens com a sua virtude”. Lendo isto me veio à cabeça certos artistas brasileiros, sempre pulando de causa nobre em causa magnânima, mas nunca deixando de lado a majestade. Seria por amor-próprio excessivo?

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