DIÁRIO DA GRIPEZINHA

Tem a história das galinhas. Vou contar. Posso? Demorou pra responder. As galinhas mandavam e desmandavam naquele terreiro. Baixavam leis que nem elas cumpriam, mas exigia que os outros cumprissem. Faziam a desfaziam não só seus próprios ninhos, mas os das outras também. Batiam nos pintos das comadres. E ainda diziam assim: “Que é que esse pinto tá levantando a cabeça pra mim?” E dá-lhe bicada. O filhote nem tinha levantado a cabeça, só tinha olhado para a galinha assim como quem não quer nada. Mas as galinhas exultavam – seja lá o que isso signifique – em bicar, asar (bater com a asa), chutar e até esporar todo mundo naquele galinheiro conhecido por Casa de Mãe Joana. Já as galinhas não tinham nome, eram seres sem identidade, e quando se referia a elas a patroínha chamava de “domingueiras”, porque era no dia do Senhor que as aves se apresentavam à mesa transformadas em galinha-com-polenta. Elas entendiam, dentro de sua imensa galinhice, que havia um ser superior a elas, e atendia pelo nome de Dona Joana. Ou de Manhe, quando era o garoto que se dirigia à genitora. Numa manhã cálida de maio, quando todo mundo já tinha se apresentado à CPI – todo mundo, minto -, as galinhas se espantaram ao ver como aquele filhote de gente enfrentava a mãe, sapateando, praticando uma dança indígena e imitando sons de pássaros e de porco do mato. E a senhora ficava imóvel, olhando todo aquele destempero. Então, as aves, dentro de sua imensa galinhagem, entenderam que aquela criança era ainda mais forte que Dona Joana. No entanto, o menino se borrava de medo de entrar no galinheiro.

Filme: TODOS OS HOMENS DO PRESIDENTE – que já foi apresentado ontem, mas a plateia está pedindo bis.