No fundo da mata havia um Buda feliz. Ele nos guiava com suas orações que a nós soavam como canto de passarinhos. Os mais tolos de nós aceitavam que eram passarinhos conversando nos escondidos das ramas. Os iluminados sabiam que havia mensagens ditas em língua antiga. Eu era um dos tolos e procurava na montanha aquilo que me completasse. Dos sons da mata ouvia pássaros e regatos, o vento que sussurrava manso ou nos assustava com sua intensidade. E pássaros e águas e vento eram parte desse Buda que nos alimentava. Quando me iluminei para essa realidade tudo estava fora de lugar e os seres do escuro tinham tomado conta de nossa montanha. Eu salvei um Buda feliz e o trouxe comigo. É ele que me alimenta com a lembrança de dias felizes, de quando as pessoas se reuniam para comemorar a alegria de sermos amigos.
Era tão mais fácil ser bom do que cultivar o amargo. Era tão mais doce prestar ajuda do que atirar pedras. Que alegria poder mudar o choro de uma criança, ter o poder de transformar lágrimas em sorrisos. No entanto, somos egoístas. Não queremos dar imaginando que dando tiramos algo de nós. Perdemos. E queremos ganhar. Sempre. Se pudéssemos entender que esse dar tem outro sentido! Dando a mão a quem precisa não perdemos nada, mas nos enriquecemos com a alegria de dar. Que preço tem o sorriso que conseguimos para uma criança? Que preço tem nossa alegria ao mitigarmos uma dor seja a quem for, animal ou gente? Queremos ganhar sempre e o que precisamos entender é que ganhamos muito mais sendo doces do que amargos. Essas lições eu aprendi sozinho, andando na mata, falando com as árvores, pedras, ramas, e estava falando comigo mesmo, com o espírito dos antepassados que habita em cada um de nós. Não é preciso ter uma religião para sermos humanos. Basta o amor pelas coisas do mundo, o resto está implícito em nós.
As tempestades são tão reais nos meus sonhos que sinto os respingos e o frescor da ventania entre meu acordar e dormir.