DIÁRIO DA PANDEMIA
O senhor Otávio, do bloco A, tomou a vacina semana passada. Não o vejo mais debruçado na janela vendo a vida passar. Vai ver, já virou jacaré e está com vergonha de mostrar o rabo. O que não sucede com Dona Otília (chamo de Otília porque não sei o nome). Ela já mostrava o rabo antes de tomar a vacina. Não foi isso que eu quis dizer. Entre meus amigos mais chegados tem o capitão. Um dia ainda vou descobrir como ele se chama. Diz que não vai tomar vacina, que vai esperar chegar o spray nasal de Israel. Enquanto o spray não chega vai metendo nariz adentro, o que ele diz que é croroquinha em pó, que encontrou por acaso dentro de um helicóptero caído no mato. O que tenho percebido é que o tratamento entre as pessoas mudou um pouco. Acabou esse negócio de meu senhor, minha senhora. Agora é Jacaré Fulano de tal, Jacaroa fulana de tal. Os mais idosos costumam receber o apelido carinhoso de croc, seja lá o que isso signifique. Os netinhos é que chamam os vovôs de croc. Talvez porque com a idade os velhinhos fiquem mais crocantes. Mas se os meus vierem com essa bobagem faço voarem pela janela. Não sou de ficar com desaforo em casa. Daí, o capitão meu amigo quis saber o que eu achava do auxílio emergencial. Respondi que era um benefício. Ele ficou feliz. Daí eu disse que guardava para mim o benefício da dúvida.
Filme: E LA NAVE VA (direção de Federico Fellini. Com Freddie Jones, Barbara Jefford, Victor Poletti e mais um bando de gente que nunca ouvi falar). Essa bela película mostra uma reunião de condomínio, com Dona Síndica à cabeceira e os condôminos ali, como quem não quer nada. Daí, o garoto do capitão, que desta vez não estava vestido de Robin, deu a ideia de fazer a boiada passar na calada da noite.