Alguém perguntou “paixonou?” ao ver a sequência de fotos de Renata Vasconcelos explodindo beleza na telinha. Joan Didion entrou de repente para completar o que o que o grande Ruy Castro disse recentemente: que se emociona muitas vezes ao dia com as descobertas que faz. Ele é do time dos dependentes em recuperação. Há mais de trinta anos – só por hoje! Talvez seja por isso, mesmo porque, quando bebia e atravessou a linha e entrou no pântano do alcoolismo, não poderia enxergar o que a vida nos proporciona e a doença impedia seu talento de explodir na magnitude total da escrita, essa que acompanhamos nos livros, colunas, etc. A apresentadora do Jornal Nacional passa, com sua beleza esfuziante e tranquila, um senso de equilíbrio e tranquilidade que é possível sentir, mesmo diante da enxurrada de notícias trágicas deste país amalucado, destrambelhado. É uma impressão. Pode ser que na ‘vida real’ não seja isso, mas é o que atravessa a tela para o lado de cá. Joan Didion é hoje uma senhora de 86 anos que apareceu recentemente numa dica de livro sobre ‘quem escrevia errado’ – e trata da turma que, colocadas num nicho, grosso modo, é a do jornalismo literário, ou seja, está ao lado de Tom Wolfe, o da excepcional reportagem “Os Eleitos”. Ela, no entanto, é de um departamento especial, pois, imagina-se, nasceu para expor a própria alma e também a leva-la a olhar, conversar e escrever sobre John Wayne, Joan Baez, uma das acusadas de assassinar Sharon Tate, a barbárie de uma guerra civil num país da América Central, os políticos no poder que vivem tão distantes da população de um país como, por exemplo, se a Casa Branca estivesse escondida além do Buraco Negro do Universo. E não há um tico de raiva, uma lágrima de lástima, mesmo quando ela escracha seus dramas no que escreve e fala. Disse, no excelente documentário que está à disposição na Netflix, que, numa certo tempo da vida, se viu desprovida de esperança, mas que não entregou os pontos, como se diz no nosso linguajar, e seguiu fazendo o que sabe – e como sabe! Também escreveu roteiros de filmes baseados em livros seus e, numa entrevista, disse, com todas as letras que o que se via na tela era uma coisa que não tinha nada ver com o que estava nas letrinhas impressas no livro. Para escrever um dos seus ensaios, demorou dez anos – e aí vem a lembrança o nosso Dorival Caymmi, que levou o mesmo tempo para fazer uma de suas músicas. Didion, Joan, é mais que perfeccionista, e agora, na idade avançada, espeta pela casa pequenos cartões onde anota algumas ideias, como fazia na infância/adolescência num diário. Na mesma telinha da tv que mostra a beleza de Renata Vasconcelos, ela aparece com todas as marcas da idade, magra (chegou a pesar 34 quilos durante um bom tempo), resultado do que viu e sentiu, principalmente a morte prematura da filha Quintana, sobre o qual escreveu um dos seus livros. Alguém um dia lhe perguntou sobre a imagem que construiu para finalizar este acerto de contas com ela mesma. Respondeu e e se resumiu: ‘É isso’.
Você não usa os dedos para escrever. Usa a alma.
Descobri a fórmula! Vou te provocar mais vezes. Brilhante a resposta, ZB! Padrella tem razão. Você escreve com a alma… até mesmo pra falar do bico da chuteira! Parabéns!