13:15Sonho ruim

de Fernando Muniz

No escritório de um amigo advogado, homem de bem e preocupado com o futuro do país, encontro o discurso de um ministro do Supremo Tribunal, perdido entre petições e outros documentos importantes.

Cheio de esperança na juventude e crente no futuro e nas instituições democráticas, a peça é uma aposta na habilidade que povo teria de construir uma sociedade justa e solidária, mesmo diante de tanta violência, falsas promessas, maus exemplos dos governantes e da profunda indiferença de quem se diz elite com a sorte dos mais humildes.

Coisa de um Profeta, egresso da tumba para guiar os perplexos, com a missão de apontar caminhos e semear certezas. Nem parece algo escrito por um funcionário público e, sim, por um iluminado, alguém que acredita poder mudar o mundo com palavras.

Termino a leitura rápido, com medo daquele palavrório castiço, recheado de palavras bonitas, sem erros de concordância nem crases fora do lugar. Tão longe da vida acidentada e sem rumo que se esparrama pelas cidades e campos do país.

O chão começa a tremer e os móveis saem do lugar; largo tudo para trás, inclusive o discurso, que se mistura à papelada, em total desordem. Tento alcançar a porta do escritório; este é o lugar do meu amigo e suas fantasias. Não tem nada aqui para mim.

Mas não consigo ir embora. Não dá tempo de evitar que o chão se abra e me engula, de um golpe só.

Junto com as ilusões dos juristas.

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