DIÁRIO DA PANDEMIA
(*) Daqui da janela vejo o Jolim, meu cachorro amigo, com quem eu brincava. Falo muito baixinho, para ele não ouvir: “Ei, Jolim”. Mas, ele escuta porque cães têm o olfato sensível. Fica parado, olhando para mim sem mágoa ou crítica. De longe pude ler em seus olhos o que me dizia: “Você não foi me salvar da carrocinha”. Não, Jolim, você não foi salvo. Você foi para um longe tão longe que não se pode perceber. O portão aberto para a rua não significava, afinal, a liberdade. Olho meu país. O povo tratado como cachorro, e nem um portão aberto por onde se possa escapar para a sonhada liberdade.
(*) O vizinho do andar de cima, o general do ofurô, acaba de chegar com uma tartaruga. Deverão ter bons diálogos, os dois. Talvez seja um cágado ou mesmo um jabuti, eu confundo um com o outro. Não tem gente que confunde democracia com fascismo? Então! Eu confundo cágado com fascismo, pra mim tudo é tartaruga. Não resisto e grito daqui de cima:
– É uma pizza?
– Cágado. – responde o militar ofurado.
Me faço de desentendido:
– Vai ver, foi alguma coisa que o senhor comeu.
(Sempre trato militares com deferência. Medo de que me mordam).
Aí, ele desencapou a peça e vi o que me pareceu ser um tatu.
– Tá tudo bem? – perguntei.
Em resposta agasalhou o quelônio de encontro ao peito. Percebi que havia amor.
(*) Esses papos magros que acabo escutando sem querer. Que passam pelas frestas dos entre portas, antes fosse pelas frestas dos entre pernas. O cara disse:
– Não lhe dou razão, Alzira.
– Mas, eu estou com a razão.
– Eu sei. Se você já a tem por que teria eu que lha dar?
Vontade de responder: “Quiser dar, dê; amanhã talvez ninguém esteja mais afim”.
Cortaram a discussão com uma mordida. Me senti meio invasivo.
SEGREDOS DO IMPÉRIO DO BRASIL – “Não tens o direito de vires cá para criticar minhas atitudes, rapazinho” – frase atribuída à Princesa Isabel quando Antonio de Castro Alves declamou: “Meu Deus! Meu Deus! Mas que bandeira é essa?”