DIÁRIO DA PANDEMIA
- Cada morte anunciada faz morrer meu coração. Há um maluco dando festa, nessa festa estamos mortos. Adeus, senhora viúva, me espere na porta do céu. Podia ser diferente. Podia toda essa gente estar ainda abraçando familiares e amigos. Quando o perigo já vinha, quem que não adivinhava o Mal nos olhos do corvo?
- Encontro meu irmão na cozinha. Está de costas para mim, o olhar parado no tempo. Toco em seu ombro e lhe digo eu sei que estou sozinho na casa. Vejo meu pai no corredor, uma visão rápida e imprecisa, como no 8 1/2 de Fellini. Minha mãe no quarto de costuras, telec telec, pedalando a velha máquina Pfaff. Quem é essa menina que me aguarda na sala, um ramo de violetas na mão? .
- Quando o dia vai embora e a noite se aquieta chegam vindo de ondes que desconheço essas figuras que alegram o silêncio por toda a casa espalhado. Infância reinventada onde alegres personagens davam vida ao meu viver. Não na infância real, quando eu-menino só tinha como brinquedos a casca de um pinhão e um palito de fósforo. E o esqueleto de um besouro vermelho e azul que como veio sumiu.