de Fernando Muniz
lá no meio do deserto ameaçador há uma caverna profunda e dizem que chega ao centro da terra o que aterroriza e ao mesmo tempo atrai e por via das dúvidas curioso magnetizado por aquela escuridão em pleno dia claro entro meio sem rumo passando a caminhar durante horas o que aos poucos faz substituir a luz do dia por uma pálida claridade mais e mais fraca mais e mais parecida com a luz branca e gélida das câmaras frigoríficas até a luz finalmente desaparecer encharcando meus passos com um denso negrume o que me faz ouvir apenas minha cadência monótona sem um outro som sequer trazendo a tentação de querer voltar para casa em vista dum medo terrível se apossar de mim tornando-me objeto flutuando no breu e aliás até começo a desconfiar se efetivamente entrei numa caverna mesmo ou se não estou vagando pelo espaço sideral o que me faz tentar tocar as paredes da caverna mas isto é impossível porque não consigo achá-las de jeito nenhum e a sensação de vazio é imensa porque só e acompanhado apenas de meus passos a solidão se torna sufocante ora ora Para onde irei nessa jornada começo a indagar Para o centro da terra mesmo porém Onde ele está pois na medida em que dele me aproximo mais parece que me perco nas alturas para além das montanhas e por conta disso um torpor gigantesco toma conta do meu espírito tal qual doença e num gesto de supremo esforço desisto da busca pois tenho firme impressão de que se persistir acabarei me desintegrando em milhões de partículas e assim covardemente volto em disparada à superfície porem aqui chegando fico desapontado porque ao esperar que a luz do dia e as formas do mundo exterior preenchessem o vazio que senti surpreendo-me por elas não servirem mais para isto afinal o negrume marcou minha carne indelevelmente ao denunciar como inconsistentes as formas do cotidiano para orientar meus passos e afinal de contas o mundo exterior desfigurou-se numa pálida lembrança do que foi um dia contudo noto que a minha sombra não me acompanha mais Onde teria ficado Grudada ao breu da caverna Ou em algum canto dessa jornada e por esses motivos viro-me à esquerda à direita olho para frente e para trás e nada ela não está mais comigo Onde irei me agarrar Qual tábua me salvará Qual caminho me levará àquele mundo que vivi porém tais perguntas não têm mais valor algum por isso sigo alameda após alameda como se na vida não existissem vírgulas pontos ou exclamações e mais e mais oprimido pelo peso terrível que me acompanha rua afora a rir docemente dos meus desatinos volto para casa onde os dias continuam aparentemente normais aparentemente produtivos aparentemente continuo trabalhador certamente continuo filho ou irmão e tristemente noto que não consigo mais comunicação com o gerente do banco o qual perturba tanto a minha vida com a sua lógica impenetrável e hermética feita de dados os quais possuem para mim nenhum significado e apesar de ter saído da caverna não sei por qual saída acabei por escapar e sequer tenho condições de analisar se mesmo saí de alguma caverna ou seja não sei onde estou ou melhor desde que entrei na caverna tenho a estranha impressão de que não estou em lugar algum e não pertenço a nenhum lugar pois o mundo se foi e dele resta só o vento frio a bater na janela e após alguns minutos encontro finalmente a escuridão do quarto poucos segundos antes de dormir o meu espectro enegrecido feito betume e ao invés de me assustar com a sua respiração ofegante não me espanto com essa aparição súbita porque é como se há muito ele estivesse ali e eu nunca o tivesse visto bem naquele canto atrás das cortinas escondido à minha espera pacientemente até a noite de hoje sempre inabalável na sua certeza de que um dia nos encontraríamos e em comemoração nos cumprimentamos friamente sem trocar palavra e assim saímos a flutuar com asas de chumbo rumo ao oceano do inconsciente
Eu passei pelo mesmo apuro e não foi sonho,eu morava na fazenda São José ,entre Jataizinho e Rancho Alegre e sempre ia fazer compras na Vila Esperança a cerca de 3 KM da sede da fazenda.
Para chegar na Vila Esperança tinha um mato e a estrada passava no seu meio e logo no fim havia um areal e um km adiante era a Vila.
Fiz minhas compras na venda do sr Manoel,comprei uma gaitinha de boca para soprar um pouco e comecei a tomar umas biritas,e não percebi que anoiteceu,então segui pela estrada com um receio que o areal antes da mata,as onças saiam para talvez olhar o luar e namorar.
Quando cheguei no areal ,as onças estavam assanhadas,esturravam sem parar,e eu sem saída,já no meio do areal,cavei um buraco com as mãos e me cobri deixando só o nariz de fora.
Lá pelas tantas veio uma dessas pintadas e sentou com o fiofó sobre meu nariz ,e a danada devia ter comido um bezerro inteiro,por que bufava fedido e eu já não aguentava mais.
Nisso me veio uma ideia,com muito jeito,tirei a gaitinha do bolso da camisa e soquei no rabo da onça.
Foi assim que me safei,ela saiu pelo areal peidando ,e a gaitinha tocando a “saudade de Matão’.