7:45Grão de instante

de Yuri Vasconcelos Silva

Ele tira fotos com braço esticado apontado a si mesmo. No álbum virtual, todas as imagens são do próprio rosto, do corpo que veste ou desnuda. Faz vídeos sobre a própria vida e opina sobre tudo. Dança, faz caretas, malabarismos egotistas de uma previsão de Warhol, o artista. Quando chegam as férias, o corpo se insere em panoramas de espetáculo, como faria um diretor de fotografia em uma cena bem bolada. Uma platéia se forma, desde que bem retroalimentada: é necessário ser espectador de outros palcos também. Não só da própria imagem se nutrem nesse curioso canibalismo. Há aqueles que ostentam seus predicados intelectuais, através da exibição quase obscena de livros, tratados, equações e conjecturas que assimilou como uma traça faminta. Dessa maneira, multiplicam-se as categorias. Os que idolatram a própria profissão. Os que se acham engraçados. Os defensores das causas de bem. Os artistas. Os poetas. Todos unidos pela fita que não falha ao amarrar a condição humana, aquela que o diabo mais aprecia: a vaidade. A obsessão em externar o que se deseja ser, este corpo que habita o mundo e é visto por ele, parece uma fuga em que se sabe o fim, a inevitabilidade do olhar para dentro. Mesmo uma vida inteira fazendo barulho e esperando um retorno em eco não é suficiente para escapar do retorno a si mesmo, que nunca falha. É provável que o mais temido selfie seja o flash interior, quando a exploração pode, enfim, terminar num insuportável vazio. O silêncio parece ser território perigoso, onde se ouve a própria respiração, o batimento cardíaco e a voz que roda como uma gravação em loop infinito. Então, o que fazer? Viver na superfície, para não se afogar, e lançar imagens e sons para o mundo, como cordas atiradas aos outros, mantendo sempre as cabeças fora deste silêncio ainda não conhecido, e por isso temido. Uma rede, similar a uma vasta teia, em que todos parecem estar seguros. Mas é apenas por um instante. 

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