de José Maria Correia
E essa cruz de cinzas, a que em meu rosto de criança marcaram na Catedral de sombras e se fez eterna.
E o rufar dos tambores e as matracas da sexta feira da paixão que me faziam esconder de medo dos fiéis de capuzes a carregar o senhor morto.
E as luzes das velas de cera a derreter em castiçais de prata sobre a memória de meus mortos que pensei fossem imortais.
E os círios e cravos sobre os joelhos do crucificado de porcelana com olhos de vidro mareados de desespero.
E os sonhos antigos, todos os que me roubaram e estavam guardados escondidos no baú das cartas românticas .
As que nunca foram enviadas e nem destino tinham.
E as poesias para a professora Sandra, primeira paixão, tão ingênuas e piegas, rapidamente apagadas do quadro de giz do Grupo Julia Wanderley , e ocultas de vergonha entre as lições de gramática.
E o inventário feito de todas as noites de insônia das milhares de estrelas desaparecidas e naufragadas em algum oceano perdido onde sumiram .
Onde estará então o mapa do rumo perdido e infinito de minha alma ?
O que nunca consegui desenhar.
E a madrugada que tanto anseio e teima em não raiar, sem o canto dos galos, que já não existem na selva de pedra e de concreto.
E que como a aurora , não chega nunca para me resgatar das trevas, da agonia da noite e dos delírios sombrios, esses que me perseguem e desassossegam, em sonhos estranhos e mensagens que não entendo e não decifro.
Levado por meus passos perdidos , sigo meus delírios em direção ao nada e a um caminho que termina sempre em angústia e melancolia.
Reconheço meus passos na longa alameda de antigos paralelepípedos ,a dos anjos de faces de bronze e asas caídas .
Uma longa fileira de cedros e ciprestes, onde feixes de lírios tristes estão às portas das muitas capelas, das quais uma há tempo me aguarda e entretanto ainda me tardo.
Ando distraído por minhas finas e trêmulas mãos que insistem, espontâneas e dramáticas em redesenhar as letras, os sinais e os códigos da passagem definitiva , certa e adiada.
E a cruz de cinzas marcada em meu rosto que já não distinguo e não se apaga jamais.
Se houvesse critério, Jose Maria Correa deveria estar na Academia Paranaense de Letras onde muitos analfabetos funcionais que escrevem alguma coisa parecida com literatura se julgam escritores
Obrigado Augusto pelo incentivo
Grande abraço jm