Se arrancou de mim como se tivesse encontrado lá dentro as sete pragas do Egito e a peste bubônica. Não consegui nem erguer a mão para dar um tchauzinho ou mandar tomar nos buracos. Porque veio sem aviso, assim como um Boeing caindo na cabeça quando se aperta o botão da máquina de refrigerante e a lata começa a rolar para sair como se estivesse sorrindo. Fiquei sozinho sem poder falar porque era a única pessoa com quem eu me abria sem o risco de ser criticado e ser afogado pela culpa. Não vi se levou a roupa do corpo, mas a alma, sim. Dobrou uma esquina, por coincidência a mesma onde encontrei depois do longo período em coma. Nos apresentamos como se a gente tivesse se conhecido desde o dia em que nasci. Vai ver que foi isso mesmo. Até porque quem se mandou sem dizer adeus foi eu mesmo. Fiquei aqui olhando a lua nova e não vi Cowboy Jorge. Aí tive certeza que perdi. A esperança é que, em algum lugar aqui dentro, o que foi (repito, eu mesmo!), tenha deixado uma semente, que pode ser uma palavra, o ovo da serpente ou o passaporte para o céu ou inferno. Por enquanto não tenho forças para procurar, mesmo porque isso não se procura. Resolvi, então, gravar tudo num National Panasonic do tempo em ouvia sem parar “pode ser a gota d’água”. Na verdade o que me faz evitar de fazer a boca do cano beijar o céu da boca antes da explosão é a quase certeza de que ao apertar o play vou me ouvir como se fosse o outro.