7:04Cuba e o Cameraman

Por João Pereira Coutinho, na FSP

Passei anos procurando o filme “Cuba e o Cameraman”. A literatura crítica era elogiosa e a minha curiosidade crescia com os aplausos.

Felizmente, a Netflix escutou as minhas preces. É um documento soberbo —e documento é a palavra. Durante cinco décadas, o jornalista Jon Alpert foi visitando e filmando a ilha de Fidel, traçando a sua evolução pela vida do povo cubano.

No início, tudo é promessa —e Jon Alpert, ele próprio um idealista da revolução, vê em Cuba tudo aquilo que deseja para o seu estado de Nova York. Educação grátis, saúde para todos, habitação idem. O paraíso na Terra.

É essa identificação ideológica que o leva a conhecer Fidel, a viajar com ele em 1979 para os Estados Unidos quando o ditador discursou na ONU e até a conhecer os seus hábitos mais cotidianos.

Fidel, por quem tenho simpatia nula, revela nas conversas e nos gestos um sentido de humor bastante atípico entre ditadores. Mas depois chega 1989. O Muro de Berlim cai. A União Soviética segue ladeira abaixo. E o paraíso, que nunca verdadeiramente existiu, mostra as suas garras.

As prateleiras dos supermercados enchem-se de pó. As famílias amontoam-se em cubículos imundos. Os hospitais são açougues, com instrumentos médicos medievais e fármacos inexistentes.

Só o mercado negro permite aos cubanos uma vida ligeiramente acima da sobrevivência. Aos cubanos que não conseguem fugir, entenda-se.

Mais: quando o dinheiro soviético desaparece, o estado de natureza se instala. Fome, pilhagem, destruição —a natureza humana como ela é em plena selva.

A tudo isso, os cubanos respondem com um estoicismo que chega a ser cômico —e o filme é, primeiro que tudo, uma homenagem a esse povo admirável.

Se existe algum defeito no documentário, ele só chega no final, quando Jon Alpert consegue uma última conversa com o nonagenário Fidel. Não sabemos do que falam, a câmera fica à porta.

Mas a admiração que Jon Alpert ainda sente pelo “símbolo” da revolução é indisfarçável.

Há doenças que não têm cura.

Uma ideia sobre “Cuba e o Cameraman

  1. Ademar Luiz Vieira

    Deveria ser passado dentro das faculdades principalmente na área de Humanas para que esses pessoal assistir.
    Talvez acordem .

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