Em Curitiba – Foto de Arnaldo Alves
de Nilson Monteiro
em meio aos edifícios,
noites mortas ou lampejantes
sentimentos doloridos
em meio às farpas de lata,
ao concreto lanhado
e fiapos de aço
em meio ao que restar de terra,
do vento,
dos sustos, trovões e raios,
em meio aos restos da brenha,
do desespero e angústia,
das cancelas fechadas,
em meio ao tempo fraturado,
dicionários secos, duros
e vazios de justiça
em meio à seara de flores tétricas,
vítimas colhidas nas praias, barrancas
das erosões dos corpos
em meio a céus plúmbeos,
estrelas pálidas
de livros mofos e rotos
em meio ao cansaço
cansado de sua própria fadiga
e lágrimas de esgotos plásticos
em meio aos desastres,
desatinos, desalentos,
descrenças e danos
o nascer, o bendito sacramento
será o novo
de gravidez indesejada ao velho
a provar o milagre da vida
será o novo
barriga entumecida
nos seios das serras e janelas das gentes
será o novo
sem muros para nascituros
que calçarão seus sapatos de sonhos
será o novo
e o delicado e forte
dos tempos que virão
será o novo
em água sem salitre
aqui, lá, qualquer sítio do mundo
será o novo
a descobrir escarpas e cidades,
suas trilhas e rumos
a revelar olhos limpos
para mirar seus dias
sob véus simples e atrevidos
será o novo
sem manchas ou nódoas,
culpas, versos mudos, arautos do medo
será o novo
a andar pelas ruas, ir às escolas
e partilhar a alegria
será, sim, será
o bendito sacramento,
crianças e palavras
alimentam a alma.