por Ruy Castro
Você os conhece. São os brasileirinhos que nem estudam nem trabalham. Compõem a chamada geração nem-nem, a quem se acusa de ser passiva, folgada e, às vezes, viver à custa das mães até os 39 anos sem a menor vergonha. Mas por que botar toda a culpa nesses garotos que, no fundo, são só vítimas de anos de políticas econômicas e educacionais desastradas?
Além disso, há muitos, talvez todos nós, com quem dividir a responsabilidade pelo que está acontecendo de ruim no país. Há, por exemplo, os que nem atam nem desatam. Nem vão nem ficam. Nem atacam nem defendem. Nem dão nem descem. Nem fazem nem desfazem. Nem dizem nem desdizem. Nem pedem nem mandam. Nem calam nem consentem. Nem mordem nem sopram. Nem f….. nem saem de cima. Talvez por isso, nem arrisquem nem petisquem. Mas também não desocupam o penico.
É natural. Afinal, o mundo é relativo e aprendemos com os filósofos que há muita coisa que não é nem sim nem não. Nem isso nem aquilo. Nem melhor nem pior. Nem mais nem menos. Nem lá nem cá. Nem assim nem assado. Nem agora nem nunca. Nem pau nem pedra. Nem carne nem peixe. Nem barro nem tijolo. Nem céu nem inferno. Nem tanto ao céu nem tanto à terra. E nem tanto nem tão pouco. Mas pode ser também as duas coisas.
Há no ar uma polarização de contrários que já começa a cansar. Mesmo porque não são nem tão contrários assim –dos dois polos saem os mesmos discursos, as mesmas mentiras, as mesmas bravatas, como se eles se retroalimentassem e já não existisse um sem o outro. Daí que, por não se deixar mais iludir por esse jogo de espelhos com sinal trocado, haja agora quem não queira saber nem de esquerda nem de direita.
São os que não se consideram representados pelas duas faces da mesma moeda. É gente que, hoje, no Brasil –talvez a maioria–, se perguntada, dirá nem Lula nem Bolsonaro.
*Publicado na Folha de S.Paulo