por Fernando Muniz
O ônibus não chega. Estranho. Não costuma atrasar, nem aos domingos. O rapaz se preocupa, afinal combinou de se encontrar com os pais para almoçarem juntos.
Um porco, branco, de uns duzentos quilos, se aproxima do ponto. O rapaz olha para os lados, em busca de quem o trouxe. Ninguém ao redor. E agora, o que fazer?
O dono deve ter deixado ele escapar, só pode ser. Ou o bicho fugiu. Ou se desgarrou. Tão limpo assim, deve ser premiado.
Isso não pode ficar desse jeito; o rapaz resolve levá-lo de volta ao dono, pela estrada. Nem se preocupa mais com o ônibus.
No meio do caminho o porco tropeça e cai barranco abaixo. O rapaz se assusta com o estrondo que o bicho faz ao cair em um banhado. E pior: de branco ficou marrom, todo sujo de barro. O que o dono vai falar? Mas o porco não está nem aí. Diverte-se, enterrado até à cabeça na lama, refrescado naquele dia sem nuvens. Sendo um porco, afinal.
Só que essa diversão não pode ser. O rapaz está numa missão, não tem tempo para brincadeiras. Puxa o porco para fora do banhado, a muito custo. Tenta trazê-lo de volta à estrada; suja os sapatos e as bainhas da calça. É voltam a caminhar. Só que dali a alguns minutos o porco se atira de novo no banhado. Mais sujeira, mais alegria.
E mais resistência; o rapaz afunda na lama e se lambuza inteiro, roupas, sapatos encharcados, tudo. Não consegue tirar o porco de lá e se enfurece.
O que fazer? Pensa no que os porcos gostam de comer e encontra algumas frutas e raízes. O porco sente o cheiro e sai do banhado. Começa a correr e o rapaz se assusta; afinal são duzentos quilos enlameados atrás dele, em um trote forte. Larga a comida no meio da estrada.
O calor e o sol secam a lama das suas roupas, rápido; o rapaz começa a sentir um incômodo. Por que se meteu nessa confusão mesmo? Perde a noção do tempo. O ônibus passa por ele; nem sente forças para levantar o braço. Nem se recorda por que deveria chamar o ônibus.
Começa a catar o que restou das raízes. Encontra uma maçã, roída pela metade. Não se anima em comer. Por que está ali mesmo? Escuta um estrondo no banhado próximo. Alguma coisa lhe diz que deve ir atrás daquele barulho.
Mas, ao invés disso, tira os sapatos. Sem conserto, de tão encardidos. A camisa também, fica no chão. Larga as raízes e trata de procurar alguma coisa para se refrescar. Dali a alguns passos enxerga o banhado e, no meio, uma mancha marrom se move entre o capim, dando grunhidos, feliz.
Sente inveja daquela mancha. A água parece lhe fazer bem. Uma brisa move o capim na beira do banhado; sossego total. Ouve alguém à procura de algo, de algum bicho, talvez. Coitada dessa pessoa. Tantas preocupações naquele dia tão quente.
Ele tira o resto das roupas e resolve se atirar no banhado. Para se refrescar.
E nunca mais sair.