de Fernando Muniz
“Presidente, a situação tá ‘ingovernável’”. Macaco repete o que o advogado do sindicato acabara de dizer, sobre a invasão ao maior dos terminais portuários parados pela greve dos estivadores.
O Presidente coça a cabeça e franze o cenho. “Mas quem mandou eles fazerem isso?” Macaco, secretário-geral do sindicato, sente-se culpado pela evolução dos acontecimentos. “Não sei, Presidente; eu estava com os advogados revisando a proposta de acordo quando deu esse estouro da boiada”.
“Assim a Justiça vai dizer que a nossa greve é ilegal. Onde está o Doutor Antunes?”
Macaco olha para os pés. “Acho que na sala dele. Não conseguiu sair do terminal antes da invasão”.
“Bom, então põe o Pouca Telha, o Vesgo e o Tião junto do homem. Só falta baterem nele. Aí que a polícia cai de pau na gente”.
“Combinado”.
Dali a alguns minutos, Macaco retorna. “Presidente… o Doutor Antunes disse na TV que os terminais só voltam a negociar se o nosso pessoal sair de lá e voltar pro trabalho”.
“Ah, é? Conseguiu até dar entrevista?” O Presidente aperta os olhos, enquanto olha o cais do porto pela janela da sua sala, sem movimento algum. “Ele já devia saber que aqui a gente resolve as coisas dentro de casa. Vem cá, o Bacuri continua preso?”
Macaco pensa alguns segundos. “Não, tá solto”.
“E o irmão dele?”
“Foi solto junto”.
“Então diga pros dois e mais o Boca Mole irem lá dar uma coça nesse filho-da-puta. Depois a gente se acerta com eles. E não fale disso com ninguém, tá certo?”
“E o Vesgo, o Tião e o Pouca Telha? O que eles vão fazer?”
O Presidente olha fixo para o companheiro e dá uma risada, de sarcasmo. “Eles vão fazer o que eu disse pra eles fazerem. E o Doutor Antunes que reze pro pessoal da estiva proteger o pescoço dele”.