por José Cid Campêlo Filho
O vazamento de conversas via aplicativo entre o ex-juiz e ministro da Segurança Pública Sergio Moro com o Procurador da República e coordenador da Operação Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, tomou conta do noticiário político. Onde está o erro?
Pois bem, a normalidade é juiz, advogado e promotor falarem somente nos autos. É evidente que às vezes existem casos urgentes que necessitam que o advogado e o promotor/procurador falem diretamente com o juiz, mas somente em casos extremos. Quando o advogado deseja dialogar com o juiz, e assim deve ser também com o promotor/procurador, é marcado dia e hora. Isso é mais do que necessário, visto que se o magistrado atendesse todos os advogados e promotores, não faria outra coisa na vida.
Há juízes que designam um dia de semana somente para atender advogados. Outros, porém, se recusam a ter contato com advogado, ainda que a lei determine o atendimento aos profissionais do Direito. Por tudo isso, se os fatos e conversas noticiadas são mesmo verdadeiras (não houve negativa das partes), tanto o agora ex-juiz quanto o procurador extrapolaram suas funções.
Um Juiz não pode orientar procurador e advogado. Cada um tem seu papel. Ao orientar um deles, estará dando uma enorme vantagem para um dos lados. Por isso, na minha opinião, se vislumbra sim anormalidade. Nos meus 40 anos de profissão nunca mantive diálogo com nenhum magistrado pelo telefone. Somente pelos autos ou pessoalmente quando necessário, acompanhado do requisito da urgência.
As conversas demonstram sim um desequilíbrio na balança da Justiça. De qualquer forma, entendo que o procurador, com base nos diálogos, estava querendo ganhar as causas, o que é normal. Porém, tudo tem de ser feito dentro da ética, que me parece ter sido deixada de lado em alguns momentos. Do mesmo modo entendo que o juiz deve, quando necessário, e ainda porque é da lei, ouvir o profissional do Direito, mas não somente de forma amistosa ou colaborativa.
A conversa entre Moro e Deltan revela um juiz desequilibrando a balança, negligenciado algo muito importante para o exercício da função: acusação e defesa obrigatoriamente têm de estar no mesmo patamar. Acredito, na verdade tenho quase certeza, que o ex-juiz não tenha mantido semelhantes diálogos em aplicativos de conversa com nenhum advogado defensor de acusados nos processos em que atuava. Pois bem, nesse caso, Moro e Deltan foram além de suas funções.
*Publicado no site Plural