A solidão tem gosto de pizza brotinho. Mussarela. Comida no balcão de uma pastelaria na avenida movimentada. Duzentos anos atrás. Fim de tarde. Dinheirinho contado no bolso. Para o cinema. Para ela. Para o ônibus de volta ao subúrbio. Não sei que filme vi. Pulgueiro, o cinema. Atravessei a rua com aquela sensação de ninguém me quer. Só olhei para o botão do avental do china. Pedi. Ela veio rapidinho. Comi. Paguei. Saí. Braço esticado para o ônibus. Luzes da cidade. Sentei no último banco. Quem se importaria com um adolescente enforcado ali? Nas janelas vi que todos riam. De quê? Para sempre ficou marcada aquela sensação de ser só, sem precisar aprender. É o que me vem de vez em quando – e não há remédio ou anos de terapia que me fazem esquecer. A dor é a mesma. Mas a brotinho era gostosa. Também lembro. Talvez por isso… estou aqui, sobrevivente – e sempre pedindo pizza, oito pedaços.