por Zeca Correa Leite
Entre nós o silêncio: eu te olho sem palavras, sem lágrimas; não há sorriso nos lábios, no olhar. Sé há frestas em mim expondo minha alma, não sei. Sinto-me entregue como um engano desenganado.
Estou aqui, estás aí. Frente a frente, amistosamente. Pareço estar posando para foto de carteira de identidade, forçando para a imagem resultar sem vida, inexpressiva. “Que bobagem!”, dirias se soubesses de minhas imaginações. “Destituis de ti para uma foto? Coisa tão simples, é só olhar pra frente e não piscar, manter a postura, Que tolice!” Irias sorrir com descaso, menear a cabeça, resmungar frases repetitivas até cansar e calar. Eu vazio de mim, peso pesando no oco do peito, nos ossos, no remorso por ter sido exposto. Quando me dizem “és simples, humilde”, assusto-me por não verem a complexidade que me habita.
Como não perceber a selva querendo varar a pele? Impossível perceber incêndios e gelos estalando pelos poros? Ao meio-dia não sentem o peso das sombras de minhas vielas? Apesar de tudo tenho pássaros gorjeando esperanças em meu coração. Não ouvem. Se ouvem vão pensar “é tico-tico fazendo ninho no quintal; é sanhaço fazendo algazarra; é pardal.”
Como nada é dito, cada qual guarda em si seus desconhecimentos. Em meio a tanto barulho e fala alimentamos silêncios e sonhos, pequenas e grandes fraturas, pássaros que gorjeiam esperança.
Deixas o aposento, eu te olho sem palavras.
O trem das três horas está chegando na estação.