por Fernando Muniz
“Finalmente! Já íamos começar”. É abraçado pelo irmão, com força. Perde o equilíbrio e derruba as malas no tapete. “Pois é, a alfândega estava lenta. Greve”. As crianças pulam sobre o tio, que traz chocolates e balas. Procura a anfitriã, que faz questão de se demorar na cozinha – é amiga da ex-cunhada.
“Como estão as coisas?”. O irmão tenta preencher o vácuo. “Não dá para reclamar. O serviço é tranquilo, apesar da língua, impossível de aprender. O que dói é ficar longe das crianças”. Vê os sobrinhos tentando abrir os chocolates; lembra-se dos filhos, que não vê há tempos e sorri.
“Não senhores! Só depois do almoço!” Seu tom, mais alto que o normal, deixa o marido apreensivo. “Não fique aí parado, tome os doces deles!”. Ele vai atrás das crianças, que correm se esconder.
Ela o encara. Faz um sinal de oi. Ele pensa em tirar um lenço da mala, de agrado, mas desiste. O irmão retorna com as crianças e todos se sentam à mesa.
A comida é farta. Tudo o que ele e o irmão gostam está lá; carne moída com quiabo, suco de abacaxi, arroz carreteiro. Bate saudade da casa cheia de gente, dos almoços de sábado sem hora para acabar, em um mundo pacato e feliz, um porto seguro, cheio de crianças a bagunçar ao seu redor. Como tempos atrás; como acontecia na casa dos seus pais.
Recebe uma mensagem: “Oie onde vc estah????”. A cunhada, que começava a trocar palavras com ele, também lê; fecha a cara de vez. O irmão percebe e, sem querer, dá um sorriso. Leva um chute. O clima pesa.
Hora de correr, urgente. Rumo à tormenta – de pau duro.