de Fernando Muniz
O garotinho se debate, levado pela correnteza, naquela manhã em que o céu limpo e o sol de primavera convidam ao nado.
Ali as marés são traiçoeiras. As pessoas se confundem com a calmaria da praia e, de repente, o mar arrasta até o nadador mais experiente.
O desespero dos pais chega aos ouvidos dela. Moradora do lugar, conhece a praia desde menina. Sabe que as chances do garoto são mínimas. Em poucos minutos será engolido e o corpo só vai aparecer lá na barra, ao final do dia. Isso se não engatar em alguma pedra. Já viu isso acontecer.
Começa a juntar gente. Alguns trazem água para a mãe, que desmaia. O pai, fora de forma, resolve ir atrás do garoto. É impedido por dois passantes, que o consolam. O homem é a expressão da impotência e da agonia. Alguém resolve entoar uma reza.
Ela limpa a areia grudada no corpo, pega o pé de pato, os óculos de natação, uma pequena prancha de isopor e entra no mar. Sem hesitação ou medo; sem conhecer o garotinho ou os pais e ciente que o risco de morrer é enorme, apesar de ser campeã de natação.
Deixa a correnteza levá-la. Olha para a praia, coalhada de pontos pretos. Não escuta mais o burburinho, muito menos prédicas ou homilias. Só ouve o mar, sereno.
Toma fôlego e chega ao menino.
E afundam.