O ministro da Defesa autoriza o deslocamento de 950 soldados para bloquear os acessos da Favela da Rocinha, no Rio, disputada entre traficantes. O menor dos grandes problemas no Rio são os traficantes, mero detalhe no grande quadro do Estado. Enquanto não forem bloqueados os acessos ao palácio do governo, à assembleia legislativa e ao tribunal de contas do Rio de Janeiro – além da CBF, o COB e outros comitês esportivos que desviam dinheiro – ações militares contra os traficantes são paliativas, abusivas e discriminatórias.
A criminalidade atinge níveis como os do Rio de Janeiro em grande parte porque os poderes constituídos e seus integrantes – de cima a baixo na escala hierárquica – também cometem crimes. Lembremos que Sérgio Cabral, ex-governador reeleito cumpre pena de 45 anos de prisão e seu sucessor, vice por dois mandatos e por ele eleito, está com o próprio mandato sub judice na justiça eleitoral.
Na escalada de violência do Rio há essa componente de anomia, quando a ordem e a lei deixam de ser referenciais de comportamento. Hélio Luz, chefe de polícia do Rio entre 1995 e 1997, disse uma vez que a criminalidade se alimenta no mau exemplo das autoridades, que o bandido, como a criança, precisa do exemplo de quem está acima, o Estado e os pais.
Já faz parte do folclore policial o episódio do criminoso carioca que, quando abordado pelo policial que oferecia colaboração, não só recusou como saiu com a frase hoje clássica: “Bandido é bandido, polícia é polícia”. No Rio – que difere do resto do Brasil, não excluída, Brasília, apenas na escala – o traço ‘ético’ do bandido carioca perdeu o sentido, os personagens se confundem. Vide a Operação Lava Jato e outras tantas, tantas que já buscam na mitologia e na história os rótulos de identificação. (Rogério Distéfano)