A batalha de sempre contra o amor dos cachorros. Mas não adianta a armadura, os sustos, o desprezo, nada. O amor deles é o mais puro e incondicional. Um dia cheguei na casa de um primo e vi o bichinho com a corrente presa a um fio esticado ao lado de um muro. Ele ia e voltava sem poder dar um passeio livre – mesmo dentro do quintal. Quando o dono chegava, fazia festa e os olhos brilhavam de felicidade. Ele não dava bola, como eu – talvez um mal de família. A veterinária disse que se conversa e se sabe tudo deles pelos olhos. Vi aquele morador de rua que anda com o animal dele encaixado no cangote. O bicho irradia paz de espírito. Deve ser o único animal do planeta que vive nestas condições. Também vi um ser sacrificado com tiro na testa. Era lindo e, por causa de uma orelha caída, ganhou o nome de Van Gogh. Sou avô da Úrsula, filha de um cachorro que me amava e eu me fingia de frio. Mas ele chegava de mansinho e esfregava o alto da cabeça nas minhas pernas. Sempre. Eles aparecem na minha vida de uma forma ou de outra – e sempre me testando, sabendo que travo a batalha para não revelar o amor escondido. Mas os bichos sabem – e não se acanham na demonstração constante, como se quisessem ensinar os seres humanos.