19:20ZÉ DA SILVA

Por anos era o olhar pirambeira acima. Não tem como subir! Os pais estavam ali, a empurrar (ou seria a puxar?), da maneira deles, mas alma pedra era muito mais pesada. Olhar um pouco para o Céu, decorar o catecismo, confessar, hóstia grudada no céu da boca – e um dia, na saída da igreja, diante da pracinha com banca de jornal no meio, matou deus, mesmo sem conhecer a frase de Nietzsche. O anjo protegendo as crianças na estradinha de terra ficou pendurado na parede do quarto, mas ali também havia o desenho de Alan Voss, onde uma freira era sodomizada por um  grandalhão mascarado que, depois, ele comparou ao Cadelão, personagem de Nelson Rodrigos. A pirambeira virou uma reta plana, de uma hora para outra. Ele andou um pouco e, depois, estava era despencando por aquela estrada da vida sem trilha de Milionário e Zé Rico. Bateu com a cara no chão. Várias vezes. Até se erguer pelos cabelos e dar um passo pra frente – um atrás do outro, devagar. Então olhou para trás e viu que tinha filhos – e cicatrizes no corpo e na alma. Eles se juntaram a ele, e caminharam. Aprendeu que não precisava empurrar. Apenas andar e falar a respeito de tudo que tinha aprendido.

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