Tinha uma parte “não sei” e outra que podia esfaquear quem lhe dissesse não. Era poço e vulcão. Não, ele não sabia porque se viu assim. Pobre acha que terapia é coisa de viado rico. Às vezes se trancava embaixo do cobertor. Tudo sem sentido. Dali a alguns dias era capaz de roubar uma margarida para dar à dona da pensão – e achava até bonita a verruga que ela tinha com pelos quase ao lado do narigão. Alguém lhe perguntou um dia sobre os pais, isso depois da segunda dose de pinga barata. Nessa hora não ficou “não sei” e também não lhe veio a fúria. Era um nada como as informações sobre eles. Quando se viu gente estava no internato sendo acordado com um tapa na cara. Até hoje sente o calor no lado direito do rosto. Pagou a conta e foi andando pela rua de paralelepípedo, mãos nos bolsos da calça, olhar nos bicos do tênis surrado. Uma tampinha de garrafa apareceu. Ele chutou. Ela foi direto para o bueiro. Sentiu uma pontada no coração. A mão direita afagou o peito. Olhou para a frente. Os faróis brancos de um carro o iluminaram. Ele foi para a calçada pensando que era assim mesmo. A vida – mesmo sem vida.