por Ruy Castro
Agora que estávamos nos acostumando à figura do corrupto —afinal, há séculos convivemos com ele—, eis que surge um novo animal na floresta: o corruptor. E em alto estilo: enorme, viscoso, tentacular, falando de cifras com que nunca sonhamos e com uma naturalidade que escancara para nós, de repente, toda a nossa inocência.
Com que, então, os milhões e bilhões que só conhecíamos por ouvir falar existem de verdade e não como papéis simbólicos, trocados por bancos e governos. Apesar do volume, são moeda corrente entre pessoas reais e circulam em malas, mochilas, meias e depósitos no Exterior, ou na forma de barcos, joias, sítios, tríplexes, aeroportos. A cada denúncia, os montantes têm sido de tal ordem que nos arriscamos a ficar blasés: “Mas como, tanto barulho por R$ 5 milhões? Ainda se fossem dólares…”.
Enfim, se o corrupto não é novidade, nada mais fascinante nos últimos tempos do que nos defrontarmos com o corruptor —o que nos tem sido oferecido à larga pelas gravações da Lava Jato. Desse espetáculo, que supera qualquer reality show, pode-se inferir algo sobre a personalidade de ambos.
O corruptor tem desprezo pelo corrupto. Olha-o de cima para baixo, trata-o pelo primeiro nome ou pelo diminutivo, ignora a liturgia, marca local, dia e hora da visita ou chega sem avisar —claro, se é ele quem paga as contas, presta-se gostosamente aos achaques e compra políticos como se fossem bananas. O corruptor vai às compras com uma longa lista: transferências de fundos públicos, medidas provisórias, primazia em concorrências, isenção de impostos, empréstimos em bancos oficiais. O corrupto avia esses pedidos e, em troca, leva o seu. Mas o ganho do corrupto é pinto se comparado ao do corruptor.
Desprezado pelo corruptor, só resta ao corrupto, em troca, nos desprezar.
*Publicado na Folha de S.Paulo
Lembrei de Eduardo Requião e Roberto Requião.
Não sei por que.
Pois eh, somos a base dessa piramide vergonhosa, somos em numero muito maior, temos o poder de acabar com essa corja e não fazemos, porque somos burros de memoria curta, nos vendemos por chinelos e bolsas familias, na realidade todos merecemos o que está acontecendo, somos um povo bunda.
Não existe corrupto sem corruptor; são irmãos siameses no ilícito ou no crime; às vezes podem ser “primos distantes” ou mesmo “ilustres desconhecidos”. Mas o dinheiro é sempre do cofre público.