Quando durmo entro na realidade. Ela é fantástica! Eu sempre saio vivo, mesmo levando tiros. Passo sufoco, mas não guardo na memória. Quantas vezes caí no precipício escuro e sem fim! Acordei suado, com a cara enfiada no travesseiro e o despertador azucrinando. Aí vem o pesadelo, mesmo porque saio da cama com fome e minha barriga aumenta cada vez mais. Pão francês com muita manteiga e queijo. Dois no café da manhã. Três no lanche da tarde – nessa hora o queijo recebe a companhia do salaminho. Muito. Feijoada no almoço e na janta. Coca-Cola para que tudo desça a contento até o bucho. Três litros. Depois? Não contam. Me telefonam para falar apenas sobre problemas emocionais, sexuais e financeiros. Me informam que o país está acabado. Eu olho o relógio e as horas não passam. Quero voltar para a realidade. Lá sou amigo de mim mesmo. Não há celular, televisão, nada. Apenas os acontecimentos como se fosse um filme onde sou protagonista. Se soubesse que tudo seria assim para sempre depois que aquela bala dum-dum guardada com carinho na caixinha antiga de madeira fizesse a trajetória rápida do céu da boca na direção do cérebro…