por Fernando Mena
A euforia provocada pela divulgação da lista de ministros, senadores, deputados, prefeitos e empresários com investigação aberta pelo Supremo Tribunal Federal pode dar lugar ao desencanto a partir de uma rápida revisão de fatos e eventos recentes da República.
A sopa de letrinhas de partidos citados é abrangente o suficiente para indicar envolvimento amplo, quase generalizado, nos crimes de corrupção e caixa dois.
Mas a expectativa de passar o Brasil a limpo precisa ser confrontada com o caráter embrionário da fase atual, com a dificuldade de produzir provas dos crimes anunciados e com a velocidade de andamento do processo penal no Brasil.
Primeiro, portanto, a abertura dos inquéritos não implica culpa –ou seja, o que se avalia nesta fase é que existem indícios suficientes para que o sujeito seja investigado.
Segundo, a investigação precisa produzir provas dos crimes dos quais o sujeito é suspeito, via de regra corrupção, peculato (desvio de dinheiro público) e lavagem de dinheiro. É difícil, no entanto, que se chegue a essas informações sem seguir o bordão “follow the money” (siga o dinheiro), o que implica passar pelo sistema financeiro do país e tornar a investigação mais complexa e longa, além de incluir atores deste setor no balaio da corrupção nacional.
Vencida essa fase, a Procuradoria Geral da República (PGR) precisa aceitar ou não as provas como indicativas da autoria dos crimes e oferecer denúncia ao STF.
Dois anos depois de divulgada a chamada lista de Rodrigo Janot e da abertura de inquérito contra 50 políticos, em março de 2015, 40% dessas investigações foram arquivadas no todo ou em parte, ou juntadas a outra apuração pela PGR. Ou seja, a questão vai além do binômio culpado ou inocente: é possível comprovar a culpa?
E aqui entra o terceiro ponto: a conhecida morosidade da Justiça pode garantir que boa parte dos crimes cuja suspeita foi anunciada prescreva antes de chegar à corte.
Basta relembrar o caso recente do senador Renan Calheiros (PMDB-AL), cuja acusação de peculato demorou seis anos entre abertura de inquérito e oferecimento da denúncia e outros três anos para que a denúncia fosse aceita pelo STF. Ainda não entrou na pauta da corte para ser julgado.
A maior parte dos crimes em questão prescrevem entre 12 e 16 anos, e esse tempo é reduzido pela metade nos casos de réus com mais de 70 anos, faixa etária de alguns dos suspeitos da ocasião.
Há, ainda, o término do mandato do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em agosto. É ele quem chefia a equipe responsável por aceitar ou recusar as provas produzidas, oferecendo a denúncia ao STF.
Sua substituição ocorre a partir de lista tríplice, da qual o presidente da República pinça o eleito. Em outros tempos, o titular do cargo respondia pelo apelido de “engavetador geral da República”. No contexto atual, há muito em jogo no âmbito desta escolha.
A esperança de que o Brasil de hoje avance rumo a um país com menos corrupção precisa de lastro do controle e da pressão sociais para que não se mude tudo para que continue como está.
*Publicado na Folha de S.Paulo